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DO CENTRO À BARRA FUNDA

15 anos do Fórum Ruy Barbosa: caminhos do TRT-2 pela cidade de São Paulo

No dia 26 de março, o Fórum Trabalhista Ruy Barbosa (FRB) completa 15 anos de funcionamento. Inaugurado em 2004, após um longo e conturbado processo de construção, tornou-se marco da atuação do TRT-2 na capital paulista e referência para aqueles que buscam ter seus direitos reconhecidos. Ao longo desse período, o prédio passou por várias reformas, acomodou mais setores do Regional e hoje é o maior fórum trabalhista do país, recebendo cerca de 25 mil pessoas e realizando mais de 1300 audiências todos os dias.

O começo da construção do Fórum Ruy Barbosa remonta aos primórdios da década de 1990, mais precisamente ao ano de 1992, quando o projeto dos arquitetos Decio Tozzi e Karla Albuquerque saiu do papel. À época, o Regional já contava com o Ed. Sede, na r. da Consolação, com boas instalações e estrutura, que passaram a acomodar as unidades da 2ª instância e o Corpo Diretivo, em 1980. Porém, as juntas de conciliação e julgamento (atuais varas do trabalho) permaneciam espalhadas em prédios no centro da cidade, alguns em situação precária, o que dificultava o trabalho de servidores, magistrados, e consequentemente, o atendimento aos jurisdicionados.

Fórum Ruy Barbosa, TRT-2, Justiça do Trabalho, Barra Funda
Dependências do Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, na av. Marquês de São Vicente, 235, Barra Funda (Fonte: acervo TRT-2). O projeto dos arquitetos, por meio de sua forma espartana, pretendia dissociar a imagem da Justiça como órgão a serviço das elites e aproximá-la da população em geral. O edifício é constituído por dois blocos com 16 elevadores e 18 andares, ocupados por 90 Varas do Trabalho, o Centro de Apoio aos Leilões Judiciais Unificados, a Escola Judicial (Ejud-2), a Secretaria de Precatórios, e salas nas quais estão instaladas representações da Associação dos Magistrados (Amatra), da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), do Ministério Público do Trabalho (MPT) e das procuradorias.

Para essa geração de servidores, magistrados e advogados, a rotina de trabalho era em corredores e salas apertados, sem muita ventilação e com a certeza de que enfrentariam filas gigantescas nos elevadores e muito calor nas salas de espera. É claro que para aqueles que não vivenciaram tal época, os dias de verão no Ruy Barbosa podem parecer insuportáveis e a espera pelos elevadores nos “horários de pico” pode tirar a paciência de alguns, mas as memórias dos colegas que atuaram nas antigas estruturas do Regional são vivas e representativas do quanto o FRB trouxe de melhorias às condições de trabalho.

Nos dias de hoje, apesar dos constantes ataques que esta Justiça Especializada tem sofrido, firme e forte ela expandiu sua atuação. O processo de centralização ocorrido nos anos 2000 com o Fórum Ruy Barbosa, inverteu-se, a partir da criação dos Fóruns da Zona Leste (em 2013) e da Zona Sul (em 2014), com varas totalmente eletrônicas e ambientes muito diferentes daqueles das antigas juntas de conciliação e julgamento localizadas no centro da cidade.

A ocasião do aniversário de 15 anos do FRB é uma boa oportunidade para relembrar as histórias que nos trouxeram até aqui, muitas delas contadas por servidores e magistrados, com cenários muito diferentes dos ambientes de trabalho dos dias de hoje, e que reforçam a trajetória e os desafios enfrentados pela Justiça do Trabalho em São Paulo.

Para aqueles que ingressaram no TRT-2 após 2004, fica difícil imaginar como eram as instalações da 1ª instância na capital. Separadas, cada unidade compunha um mundo à parte, lidando com os problemas das limitações estruturais e com as características dos entornos. Tais experiências ainda permanecem vivas na memória de servidores e magistrados, que além de terem trabalhado nesses antigos prédios, também participaram ativamente do processo de mudança para o novo endereço, colocando a “mão na massa”, empacotando e carregando processos, em uma odisseia que transferiu 79 varas trabalhistas e mais de 200 mil processos físicos para o Fórum Ruy Barbosa.

O TRT-2 no Centrão

O centro velho de São Paulo possui seus problemas e encantos. Entre áreas degradadas e prédios históricos, com seu charme e elegância, o Centrão tem o que de melhor e de pior a cidade de São Paulo pode oferecer. É possível conhecer a gastronomia sofisticada e variada da cidade, de pubs a restaurantes, assim como a carga histórica dos largos e monumentos, mas também a marginalidade e a massa de excluídos que habitam e sobrevivem em suas ruelas. Foi nesse contexto cheio de contrastes que a Justiça do Trabalho se consolidou em São Paulo e que muitos de nossos colegas, grande parte aposentada hoje, fizeram sua carreira no Regional.

O TRT-2 ocupou diversos prédios na região central e os antigos servidores puderam transitar entre os marcos da cidade. Em 1941, o recém-criado Conselho Regional do Trabalho da 2ª Região ocupou um pequeno prédio na r. Conselheiro Crispiniano, muito próximo ao luxuoso Cine Marrocos, cinema badalado da época. Mais tarde, em 1957, já como Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, mudou-se para a r. Rego Freitas, com vista para a majestosa Paróquia de Nossa Senhora da Consolação. Também ocupou, na década de 1950 e 60, prédios na r. Quirino de Andrade e Brigadeiro Tobias e, na década de 1970, juntas de conciliação e julgamento foram instaladas nos prédios da av. Rio Branco, da r. Cásper Líbero, e da av. Ipiranga – aquela famosa, que cruza com a av. São João, como narra a música de Caetano Veloso. Unidades do Regional também ocuparam a Praça Alfredo Issa, r. Aurora, r. Santa Efigênia e r. Dona Antônia, logradouros ilustres da grande metrópole.

É uma pena que hoje não existam registros fotográficos de algumas das fachadas dos prédios na época de seu funcionamento, como o da r. Rego Freitas e da r. Quirino de Andrade, contudo, os edifícios ainda estão em pé e alguns deles bem conservados.

TRT-2; Av. Ipiranga; São Paulo antiga; Justiça do Trabalho
Servidores posam em frente ao prédio da av. Ipiranga, em 1971. Foto: acervo da servidora Maria Luisa Araújo.
TRT-2; centro de são paulo; Justiça do Trabalho
Mapa com a localização dos prédios já ocupados pelo TRT-2 no centro da cidade de São Paulo. Fonte: Google Maps

De dimensões diferentes, nenhuma dessas instalações se comparam com as atuais dependências e a grandiosidade do Fórum Trabalhista Ruy Barbosa. Além disso, suas estruturas não haviam sido projetadas para receber as juntas e todas as demais instâncias e setores do Regional, o que exigia adaptações, reformas e reparos constantes e muito jogo de cintura dos servidores, magistrados e advogados. Em entrevista concedida ao Centro de Memória do TRT-2, em fevereiro de 2019, o servidor aposentado Luiz Antonio de Toledo Leite, o Totó, que atuou no Tribunal entre 1957 e 1990, lembra de algumas histórias passadas nas décadas de 1950 e 60, nas primeiras dependências do Regional:

O prédio que eu comecei a trabalhar situava-se na r. Rego Freitas, 527, onde eu exercia o cargo de servente da 4ª Junta de Conciliação e Julgamento de São Paulo. As (…) instalações desse prédio, que era o único prédio que havia em São Paulo, e mesmo assim alugado, (…) eram muito, muito pequenas, pois era um prédio residencial que foi adaptado para a instalação das juntas de conciliação e julgamento. No andar médio, intermediário do prédio, estava situado o Tribunal Regional do Trabalho, nesse mesmo prédio da Rego Freitas, que naquela época (1957) tinha nove juntas de conciliação e julgamento somente.

Ele também conta que a garagem dos fundos dava acesso à r. dr. Teodoro Baima e lembra-se que essa se tornou uma rota de fuga de advogados perseguidos pelo DOPS durante a ditadura militar. Outro fato curioso, lembrado por servidores mais antigos, era o misto de bar e lanchonete, que funcionava no piso térreo do prédio da Rego Freitas, no qual servidores e magistrados tomavam café. A lanchonete foi propriedade de Silvio Comba Esteves, que em 1962 ingressaria como servidor do TRT-2 e se aposentaria em 1992, como oficial de justiça. Comba faleceu recentemente, em dezembro de 2018.

O próprio Totó também lembra da gafieira Som de Cristal, localizada bem em frente às juntas, que era frequentada por servidores após o expediente. Na época eram poucas juntas no Regional que, com seu crescimento, foi ocupando outros prédios pelo centro.

Som de Cristal
Caetano Veloso se apresentando na Gafieira Som de Cristal, em agosto de 1968. Foto: Ariovaldo Santos/Agência JB.
Luiz Antonio de Toledo Leite, Centro de Memória do TRT-2
Servidor aposentado do TRT-2. Luiz Antonio de Toledo Leite, durante gravação de entrevista do projeto “Memórias Narradas”, do Centro de Memória, em 2019. Foto: acervo TRT-2.

Avançando no tempo, já nas décadas de 1970 e 80, uma lembrança muito vívida dos colegas mais antigos diz respeito às extensas filas que se formavam em frente ao prédio da av. Rio Branco, que muitas vezes invadiam a calçada. A servidora aposentada Uiara Maria Vieira, que atuou no TRT-2 entre 1983 e 2017, lembra que lá existiam apenas dois elevadores, em constante manutenção, o que exigia de Breno Oliveira de Moraes, servidor do Regional entre 1962 e 1992 (falecido em 2017), chefe da portaria na época, o uso de um apito para coordenar a entrada e saída do público.

Nos relatórios da presidência do TRT-2, de 1970 a 2000, é muito frequente a menção às manutenções corretivas nos elevadores dos prédios do centro, que sempre enguiçavam, além de muitas reformas e adaptações, tendo em vista que tais estruturas não eram projetadas para receber as varas do trabalho e o grande fluxo de pessoas. Alguns prédios também sofriam com infestações de ratos e baratas, que se esgueiravam pelas pilhas de processos e móveis antigos. A servidora Sônia Maria Garcia Fernandes, nomeada em 1991, atual diretora da 43ª Vara do Trabalho, conta, com sua simpatia e bom humor, que foi na Rio Branco que descobriu que “ratos não gostam de uvas-passas”, pois em um Natal, os panetones que estavam na vara foram devorados pelos roedores, que só deixaram as frutas secas para trás.

No prédio da r. Aurora, além do calor que fazia em seu interior, com poucas janelas e muito aperto, a servidora Isabel Ramos Fontana, desde 2001 no Regional (e em sua segunda passagem pelo TRT-2), atualmente diretora da 5ª Vara do Trabalho da Zona Sul, lembra que era preciso cuidado na hora de ir para casa, porque, ao cair da noite, as moças que trabalhavam nos entornos se incomodavam com pessoas atrapalhando os negócios: “Se você saía depois das 18h, corria o risco de apanhar. Qualquer mulher que passasse por ali podia ser tratada como concorrência”. Na região do prédio da av. Rio Branco não era muito diferente, a colega Sônia lembra, em tom de brincadeira, que seu marido chegou a ser assediado quando ia buscá-la na saída do trabalho.

A desembargadora aposentada Maria Cristina Fisch, que começou como servidora em 1978, no prédio da av. Ipiranga, conta que lá era muito precário, com um hall de elevador que fazia as vezes de sala de espera. Na r. Cásper Líbero, já atuando como juíza, lembra que as salas tinham uma acústica horrível, fazendo o barulho da área de espera reverberar dentro das secretarias das varas. Para resolver a questão, a então juíza resolveu arrumar uma campainha que era tocada sempre que o barulho aumentava. Essa atitude lhe rendeu o apelido de “Juíza Sininho” em uma coluna de um jornal veiculado entre os advogados, escrita por Paulino de Freitas, importante advogado trabalhista, falecido em 2012.

Apesar dessas dificuldades, existiam algumas vantagens de se trabalhar no centro. Como nos conta o servidor da ativa Luiz da Silva Falcão, que ingressou no TRT-2 em 1982 e atualmente está lotado na 57ª VT-SP, como diretor de secretaria: “Existia a facilidade de fazer as compras de Natal nas lojas do centro, além de essa ser uma região muito bem atendida pelo transporte público e possuir as vantagens dos diferentes serviços disponíveis”. Outro ponto levantado por colegas aposentados, que lembram dessa época da vida no centro com saudades, é a impressão de que as relações entre os servidores eram mais próximas e o contato com colegas de outras juntas/varas mais intenso e cordial.

O servidor aposentado Auri Fernandes Gomes, que atuou no TRT-2 entre 1985 e 2017,  aponta que a mudança para o Fórum Ruy Barbosa teria trazido maior impessoalidade no dia a dia da relação dos colegas de trabalho, algo que era diferente, quando várias juntas tinham que se apertar em alguns dos prédios do centro. Uiara tem opinião parecida, afirmando que na época das unidades do centro “todo mundo se conhecia”, e que o “FRB teria congelado um pouco as relações”.

Festas; TRT-SP; Av. Rio Branco; Justiça do Trabalho
Festa Junina organizada por servidores do TRT-2, na década de 1990, no prédio da av. Rio Branco. O servidor Auri Fernandes Gomes é o primeiro da esquerda, o noivo da festa. Foto: acervo do casal de servidores aposentados Auri Fernandes Gomes e Vera Isilda de Aguiar.

É possível que essas amizades entre colegas de varas diferentes tenham se tornado mais distantes, já que nos antigos prédios, os espaços mais contíguos levavam ao contato mais próximo. Mas, hoje em dia, são frequentes as confraternizações nas dependências do Fórum Ruy Barbosa, desde festas de aniversário até reuniões de fim de ano e, ao menos nas varas do mesmo andar, existe o contato diário dos colegas nas copas. Contudo, uma questão indubitável é que o Regional cresceu muito nos últimos 20 anos, tanto no seu atendimento na capital, quando nas demais cidades sob a sua jurisdição e, ainda assim, permaneceram essas memórias de tempos difíceis, mas saudosos.

A Grande Odisseia

Durante anos, os servidores e magistrados da 1ª instância conviveram com a expectativa de mudança para um prédio projetado para atender as necessidades do funcionamento das varas do trabalho, algo que foi alcançado somente em 2004, com a inauguração do Fórum Trabalhista Ruy Barbosa. A 1ª instância necessitava de melhores condições e de um prédio que pudesse centralizar seu funcionamento e, para isso, os arquitetos Décio Tozzi e Karla Albuquerque idealizaram uma edificação capaz de dar conta dessas demandas, composta por dois blocos de 18 andares e uma ampla praça interna.

Porém, até a finalização das obras, tudo isso parecia muito distante. A servidora Margareth Mary Machado, nomeada em 1989 e falecida em 2017, era diretora da 1ª Vara do Trabalho da Capital na época da mudança. Em entrevista ao “História Oral”, projeto desenvolvido pela Secretaria de Comunicação entre 2015 e 2016, Margareth contou como foi esperar 15 anos pelo novo Fórum:

Olha, eu tive o primeiro contato com o prédio, era um sonho, era uma maquetezinha que tinha na Rio Branco, acho que nenhum outro prédio tinha, só tinha lá. Então é assim, era um sonho que eu falava: “Isso não vai acontecer nunca, esse negócio não vai ficar pronto, esse negócio não vai acontecer nunca”. Quer dizer, eu entrei em 89 e aí era uma coisa que, para mim, eu falava: “Mas até eu aposentar esse prédio ainda não ficou pronto”. E é o que eu falei quando inaugurou: “é um sonho que era aquela maquete lá, agora é isso aqui!”

A maquete, que era um “sonho”, tornou-se realidade de concreto e aço, mas ainda viriam muitos desafios aos colegas servidores que, naquele momento, tiveram que organizar a mudança das 79 varas do trabalho existentes na época, nas quais tramitavam mais de 200 mil processos físicos. O PJe era uma realidade muito distante e talvez seja difícil imaginar as dimensões dessa tarefa no contexto atual das varas híbridas, ou totalmente eletrônicas. Por isso, antes da inauguração, a presidente do TRT-2 na época, a desembargadora Maria Aparecida Pellegrina, realizou reuniões com os diretores das varas, para definir o cronograma da transferência.

Margareth Machado, trabalhou nos dias que prepararam a mudança e conta um pouco como foi esse processo:

A mudança para o prédio novo foi uma odisseia, porque nós tivemos que fazer tudo. A única coisa que nos foi fornecido foi o caminhão e quem carregasse o processo. Então, até o processo de como fazer, fomos nós que tivemos que idealizar. (…) A minha vara ficou sendo a “vara cor-de-rosa”. Eu comprei papel cor-de-rosa para identificar todos os pacotes da minha mudança. (…) O Dr. Ricardo ensinou todo mundo como é que fazia pacote, porque ele sabia fazer pacote muito bem. Fizemos toda a mudança no braço.

Sônia Fernandes lembra que, na mudança da av. Rio Branco, para facilitar a reorganização dos processos, os servidores da 43ª VT-SP identificaram os processos com embrulhos de cores diferentes para cada tipo de “serviço” pendente. Separar, empacotar e identificar os processos demandou esforço de todos os servidores, e alguns lembram que foi preciso muitas horas extras e disposição para que tudo isso fosse feito sem comprometer demais o funcionamento adequado da 1ª instância. Wilson Bruno de Seixas Junior, desde 1999 no TRT-2, também servidor da 43ª vara da Capital, explica que, no centro da cidade, existia uma restrição para carga e descarga de veículos que acabava somente após as 20h. Por isso, no dia da mudança das varas da Rio Branco, precisou ficar até depois da meia-noite auxiliando no transporte dos processos e lembra de colegas que ficaram até mais tarde que isso.

Depois, foi o processo de desempacotar e acomodar todos os volumes na sua nova casa. As antigas prateleiras e arquivos de metal foram aposentadas, sendo utilizados escaninhos de madeira, projetados e confeccionados pelos marceneiros do TRT-2. O restante da mobília do novo fórum também veio padronizada e nova, atendendo uma antiga reivindicação dos servidores de valorização da 1ª instância.

Fórum Trabalhista Ruy Barbosa, mudança para o Ruy Barbosa, TRT-2
Servidores de vara reorganizam os processos nos escaninhos das novas instalações no Fórum Trabalhista Ruy Barbosa. Foto: acervo da servidora Isabel Ramos Fontana.
Fórum Ruy Barbosa; Vara do Trabalho; processos; Justiça do Trabalho
A servidora Isabel Ramos Fontana, no ano de 2004, nas dependência da 38ª Vara do Trabalho. Apesar do novo prédio e das melhores condições, o volume de processos continuou a ser muito grande na capital. Foto: acervo da servidora Isabel Ramos Fontana.

Luiz Falcão, que teve atuação expressiva no Sintrajud – Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal na época da inauguração do FRB, relembra que a mudança para o novo fórum trouxe grandes melhorias:

(…) Tudo se desenvolveu muito rapidamente nos anos 90 e 2000, que foram anos de muito crescimento do tribunal, tanto no número de varas, quanto no número de turmas, no número de servidores… E, posteriormente, a coroação disto, quando já estávamos no sindicato, foi a entrega do fórum Ruy Barbosa. A coisa veio numa evolução, que não havia mais como manter as varas naqueles prédios do centro da cidade, todos caindo aos pedaços, com risco de vida dos servidores e dos jurisdicionados. Você abria uma gaveta de um arquivo, aquilo vinha em cima de você… Então, a justiça estava em uma situação muito precarizada lá no centro. A entrega do Fórum Ruy Barbosa, com o mobiliário todo novo, com computadores novos, foi um marco, foi uma coroação neste desenvolvimento. Porque toda modernidade chegava primeiro no Tribunal, e depois é que isso era estendido às varas. Então o Tribunal comprava um móvel, usava lá no Tribunal, aí o Tribunal ia trocar esse móvel, aí eles mandavam aquele usado para as varas. Era uma compra de móveis usados, uma adequação de móveis usados (risos). Mas, quando se entregou o Fórum Ruy Barbosa, se entregou com tudo novo, não veio nada usado, nem pelo Tribunal, nem por qualquer outra pessoa. Então nós vimos esta evolução, né?

TRT-2; Fórum Ruy Barbosa; Justiça do Trabalho
Reportagem de capa do Jornal TRTSP, da edição de janeiro de 2004, anuncia a contagem regressiva para a inauguração do novo fórum. Fonte: acervo TRT-2. Leia a íntegra da edição do Jornal TRTSP aqui.

Contudo, Falcão também conta dos desafios que enfrentou no sindicato, nos primeiros meses após a mudança. Muitos servidores estavam descontentes com a nova rotina, alegando que o local do novo fórum era muito deserto e escuro à noite. Chegou-se a cogitar até o uso de uma perua que faria o translado dos servidores do metrô até o Ruy Barbosa. Acostumados com o centro que, apesar dos seus perigos, era movimentado e oferecia vários serviços diferentes, nossos colegas que participaram dos primeiros anos de funcionamento do Fórum Ruy Barbosa enfrentavam dificuldades até para almoçar, pois existiam poucos restaurantes nas proximidades. Falcão, com o seu bom humor e simpatia de sempre, relembra que: “(…) quando se mudaram para o Fórum Ruy Barbosa, apesar de ter recebido um prédio novo, com mobília nova, com computadores novos, os servidores estavam muito insatisfeitos. Eles, por bem dizer, quase que enlouqueceram o sindicato e esse que vos fala”.

Aos poucos, o movimento de pessoas trazido pelo Fórum Ruy Barbosa gerou o desenvolvimento dos entornos. As opções para alimentação aumentaram, os serviços da região foram melhorando, e até as constantes faltas de água no prédio diminuíram. O vazio urbano existente nas proximidades do Fórum, motivo de preocupação dos servidores, foi sendo preenchido por restaurantes os mais variados, um comércio movimentado e prédios modernos de escritório, nada comparado com o movimento do centro, mas com uma estrutura razoável para atender as necessidades dos servidores e jurisdicionados que diariamente se deslocam para o Ruy Barbosa e trazem vida para a região.

Quinze anos se passaram e o FRB voltou a dividir as responsabilidades da 1ª instância na capital com outros fóruns. Das 79 varas do trabalho que recebeu ao ser inaugurado, mais 11 novas varas foram alocadas em suas dependências, e outras 34 foram criadas e distribuídas entre os Fóruns da Zona Leste (14 Varas) e Zona Sul (20 Varas), respectivamente inaugurados em 2013 e 2014.

No ano de 2018, o FRB passou por uma grande reforma, com a instalação de proteções de vidro em suas rampas e a colocação de pisos nas secretarias das varas, em substituição aos antigos carpetes. Algumas das unidades, que possuem poucos processos físicos em tramitação puderam retirar os escaninhos de madeira e devolvê-los à Marcenaria, alterando em muito os ambientes de trabalho.

Fórum Ruy Brabosa, Justiça do Trabalho; Barra Funda
Após reforma realizada no ano de 2018, as rampas e corredores do Fórum Ruy Barbosa receberam vidros de proteção. Foto: acervo TRT-2.
vara do trabalho, processos digitais, Fórum Ruy Barbosa; Justiça do Trabalho
Servidores da 48ª Vara do Trabalho posam na frente de escaninhos vazios, no ano de 2017, após a digitalização de grande parte dos processos da vara. Foto: acervo TRT-2.

Aos poucos, as mudanças trazidas pela implantação do processo eletrônico têm modificado as dependências do Ruy Barbosa e é de se esperar que o teletrabalho, recém-implantado no TRT-2, também cause seus impactos.

Saudades e Esperanças

Na obra fotográfica “Saudades de São Paulo”, do grande mestre da antropologia estrutural, Claude Lévi-Strauss, o autor relembra de suas experiências nessa cidade que, em 1935, já encantava o antropólogo francês pela sua capacidade de se transformar constantemente. Mais do que o Rio de Janeiro e a “boca desdentada” da Baía da Guanabara, o que chamou a atenção de Lévi-Strauss foi ver uma São Paulo em pleno desenvolvimento industrial, na qual carros de bois retardavam o trânsito dos bondes, em uma cidade que crescia e tinha vocação de metrópole, mas que convivia com alguns provincianismos. E essa cidade cheia de contrastes continua se transformando e nos pregando peças, pois é capaz de se reinventar, a despeito de todas as mazelas políticas com as quais convive. Ao revisitarmos as memórias de colegas servidores e magistrados, conseguimos acompanhar essas transformações, cruzadas pela própria história da Justiça do Trabalho.

baia guanabara trtsp
Vista panorâmica da Baía da Guanabara. Em sua obra “Tristes Trópicos”, Lévi-Strauss narra sua chegada ao Rio de Janeiro e o incômodo gerado nele pela desproporção e assimetria da geografia carioca: chamou a baía da Guanabara de “boca desdentada” e depois elogiou a organização e a simetria das construções paulistanas. Uma apreciação muito injusta das belezas da cidade do Rio de Janeiro, mas compreensível vindo de uma mente afeita às recorrências, estruturas e paralelismos, que fundamentou toda uma virada no pensamento ocidental com a sua antropologia estruturalista. Foto: Gilberto Ferrez/ acervo IMS.

O TRT-2 cresceu junto com essa grande cidade, o desenvolvimento econômico e industrial gerou uma massa de trabalhadores, sindicatos e empresas, exigindo a constante atuação desta Justiça Especializada, da mesma forma que, ao levar o Fórum Trabalhista para a Barra Funda, o Regional pôde ver o impacto que gerou em uma região, transformando a paisagem urbana. Se as cidades são como textos, da maneira como Lévi-Strauss defendia, é possível dizer que o Fórum Ruy Barbosa é trecho importante da história do nosso Regional. Por sua vez, o TRT-2 é um capítulo fundamental da obra que é São Paulo, uma obra ainda em aberto, assim como a história da Justiça do Trabalho, que o Centro de Memória tem se esforçado em resgatar. Só nos resta dar feliz aniversário ao Fórum Ruy Barbosa e desejar que mais histórias sejam vividas, para que possam ser contadas.

Memórias Trabalhistas é uma página criada pelo Centro de Memória do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, setor responsável pela pesquisa e divulgação da história do TRT-2. Neste espaço, é possível encontrar artigos, histórias e curiosidades sobre o TRT-2, maior tribunal trabalhista do país.

Acesse também o Centro de Memória Virtual e conheça nosso acervo histórico, disponível para consulta e pesquisa.


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Publicado por Lucas Lopes de Moraes

Antropólogo, graduado em ciências sociais, possui mestrado e doutorado em antropologia no Programa de Pós-graduação em Antropologia Social da USP. Possui experiência em pesquisa e análise de dados qualitativos e em projetos de acervo. Colecionador de discos, apaixonado pela etnografia e pelo trabalho de campo, defende que as trajetórias de pessoas e coisas são a maior fonte de conhecimento. É servidor do TRT-2 desde 2015.

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