Não é novidade que o TRT-2 sempre reuniu famílias. Até nos dias de hoje é possível encontrá-las: irmãos, filhos, cunhados (por mais que muita gente insista em dizer que cunhado não é família – e o próprio direito civil confirme. Mas, no fim, acaba sendo, vai!).
No TRT da 2ª Região de lá de trás, daquele começo de Regional, nos anos 40, 50, 60, essa questão era ainda mais forte. São muitos os sobrenomes que se repetem – famílias que aqui se encontraram ou que aqui se construíram.
O homenageado deste mês do projeto “Memórias Narradas”, do Centro de Memória do TRT-2, é um exemplo disso.

Filho mais novo de Décio de Toledo Leite, um dos primeiros magistrados do antigo Conselho Regional do Trabalho da 2ª Região (nomeado em 1941 para presidir a 5ª Junta de Conciliação e Julgamento de São Paulo e presidente do Regional entre 1959 e 1963), Luiz Antonio de Toledo Leite é um dos irmãos-servidores de sua família.
Os outros dois são Décio Luiz de Toledo Leite (servidor entre 1948 e 1982) e Renée Alice Garcia Leite (servidora entre 1956 e 1986).






Luiz Antonio nasceu na cidade de São Paulo, em 1939. Atuou no TRT-2 entre 1957 e 1990. Foi o último dos irmãos Toledo Leite a ser nomeado. E o último também a aposentar-se.
Viveu em uma época repleta de histórias. Basta olhar para o período em que atuou no Regional para a cabeça girar com as diversas possibilidades de perguntas que poderiam ser feitas a ele. Dúvidas e curiosidades que se misturam rapidamente, em busca de informações de uma época que só pode ser contada por quem nela viveu.
A descoberta de nosso entrevistado
O nome de Luiz Antonio de Toledo Leite chegou ao Centro de Memória como uma indicação, logo nas primeiras semanas de 2019. Para nós, de um setor ainda pouco conhecido do Tribunal, a ideia de uma ligação com a sugestão de um servidor “das antigas” era, sem dúvida, muito interessante. E quem nos apontou para essa direção foi o desembargador Flavio Villani Macedo, amigo de nosso entrevistado.
Aquele momento não foi, no entanto, a primeira vez que tínhamos ouvido o nome de Luiz Antonio. Durante a primeira edição da exposição “Memória do TRT-2: uma construção coletiva”, no Fórum Ruy Barbosa, o filho caçula de Décio de Toledo Leite foi lembrado diversas vezes. Ao lado de Renée e “Decinho”, “Totó”, como é conhecido, foi personagem de diversas conversas que tivemos com servidores aposentados. E indicado por um sem-número de pessoas como possibilidade de entrevista. Afinal, “ele teria muita história para contar”.
Nosso trabalho no Centro de Memória depende muito de ajuda e de indicações. Em especial quando lidamos com fatos e pessoas conectadas a um passado não tão recente. E quando alguém é citado por pessoas diversas, a gente geralmente não ignora.
O encontro com Totó
O contato com Totó (apelido que vem desde os tempos de infância de nosso homenageado) foi feito muito rapidamente. A ideia de um projeto de história oral já martelava em nossas cabeças há um bom tempo. E já estávamos também para gravar a entrevista com nosso primeiro convidado, Luiz da Silva Falcão, dali poucos dias (e que foi publicada no dia 8 de novembro de 2019, inaugurando o projeto).
Demoramos ainda algum tempo para conseguirmos nos organizar para a viagem. Mas, finalmente, em 23 de janeiro de 2019, com uma pauta de cinco páginas, sem nem sabermos se teríamos tempo para tanto, descemos a serra rumo à cidade de Santos para conversarmos com o mais novo dos Toledo Leite que atuou no TRT da 2ª Região.
Da sisudez ao sorriso
Toda vez que estamos diante de um personagem de uma de nossas entrevistas de história oral ficamos receosos. Nunca sabemos como será esse encontro, se nosso entrevistado ficará à vontade, se terá histórias e memórias sobre as quais gostará de compartilhar. Afinal, por mais que queiramos deixar nossa visita o mais informal possível, estamos sempre lidando com entrevistas. Com uma formalidade que existe como que embutida na cabeça das pessoas. De ambos os lados: de entrevistado e de entrevistador. E foi assim que começou a nossa relação com Luiz Antonio, naquele 23 de janeiro.




É impossível não reparar na rigidez dos primeiros minutos de nossa entrevista. As questões, ainda sobre os primeiros passos que o levaram até o Tribunal, foram respondidas de forma bastante objetiva. Quase decoradas, era a sensação – como se assim fosse para não esquecer algum detalhe fundamental. Aos poucos, porém, o gelo foi se quebrando. Nossa entrevista, paulatinamente, transformou-se em uma conversa. E Totó revelou-se um incrível contador de causos.
Com a equipe do Centro de Memória, Luiz Antonio compartilhou as mais doces e divertidas lembranças. Falou sobre mudanças, experiências, família, amigos e viagens… Relembrou um Tribunal do passado que era, na verdade, novo para nós. Deu vida a momentos que sabíamos existir apenas por pequenas passagens em documentos oficiais. Deu um colorido especial a um quadro que pintamos em preto e branco, assim como nas fotos que juntamos para tentar (re)montar nossa história. De um jeito tão descontraído e familiar, que era como se estivéssemos em um encontro com pessoas já conhecidas, sem qualquer câmera ligada (ou celular, no nosso caso).



A trajetória de Luiz Antonio de Toledo Leite no TRT-2
Confira o episódio:
A trajetória de Luiz Antonio de Toledo Leite no TRT-2 é repleta de fases.
O servidor, que, aos 14 anos, sonhava em ser jogador de futebol, começou como servente na 4ª Junta de Conciliação e Julgamento de São Paulo, aos 18 anos. Naquela época, seu pai já era juiz de tribunal na 2ª Região (atual cargo de desembargador) e seus irmãos, Décio Luiz e Renée, já atuavam aqui. Naquele tempo, entrava-se nos órgãos públicos por indicação e só depois prestava-se concurso para efetivar aqueles que aqui já estavam. Foi o que aconteceu com ele.


O funcionário neófito da Justiça do Trabalho precisou aprender a realizar as mais diversas atividades para poder enfrentar o dia a dia na junta, inclusive aprender a usar a tão temida máquina datilográfica durante a audiência, ainda que isso resultasse em pequenos inconvenientes.

Totó viu e viveu muita coisa. Presenciou o aumento da quantidade de juntas de conciliação e julgamento, as atuais varas do trabalho. Quando ele entrou, eram apenas dezenove delas, instaladas no recém-alugado prédio da rua Rêgo Freitas.

Inaugurado em 1957 (depois de já ter passado por dois endereços: Conselheiro Crispiniano e Quirino de Andrade, ambos no Centro), o edifício residencial do número 527 da rua Rêgo Freitas foi adaptado para receber a segunda instância e o administrativo, em sua sobreloja, além das dezenove juntas que compunham a Justiça do Trabalho da 2ª Região em São Paulo, no restante de seus andares. No térreo, ficava a Distribuição. Todo o TRT-2 em São Paulo em um único prédio.









No subsolo, a garagem e o bar do Silvio (o servidor Silvio Comba Esteves), local onde servidores, magistrados e advogados encontravam-se ao longo do dia para o almoço, um café ou um sorvete, como lembra Totó.



Luiz Antonio viu o tribunal crescer: em 1957, eram apenas sete juízes de tribunal (desembargadores), sendo seu pai um deles. Viu também o surgimento de juntas (ele próprio ajudou a instalar uma delas, a 22ª JCJ, da qual foi o primeiro diretor, a partir de 1964), a mudança de prédios, a separação dos Regionais, a chegada do pagamento pelo banco.
“Coisa muito interessante”, como ele próprio conta, é a forma como o salário era pago naquela época. Totó fala que os servidores durante muito tempo fizeram fila na sala do diretor-geral do Tribunal, Mario Pimenta de Moura, na sobreloja da Rêgo Freitas, para receber o “ordenado”. Na sala de Mário Pimenta, o gaúcho que fumava charuto, os servidores, junta por junta, eram chamados para receber o salário – em dinheiro -, sob os olhos atentos de um funcionário da Delegacia Fiscal do Tesouro Nacional. Até nisso, por sinal, Totó tem participação.
No início da década de 60, Totó e Maurício Lenine Pires, servidor aposentado que entrou em exercício no dia 1º de agosto de 1941 (e que nos promete uma entrevista, assim que possível), fundaram a Associação dos Funcionários da Justiça do Trabalho, mais tarde absorvida pelo Sindicato dos Servidores da Justiça do Trabalho (Sintrajud).
Um dos primeiros pleitos feitos pela associação foi exatamente o pagamento dos servidores via banco. Contou-nos recentemente Maurício Lenine Pires, complementando a história de Luiz Antonio, que os servidores efetivos do Tribunal recebiam na sala do diretor. Já quem era extranumerário (ele próprio, Maurício, um deles) tinha que se dirigir à Delegacia Fiscal do Tesouro Nacional em São Paulo, órgão que antecedeu a atual Receita Federal, responsável, até então, pelo pagamento dos funcionários públicos. Ali, os servidores enfrentavam enormes filas, o que fazia com que perdessem um dia de trabalho – ônus para os dois lados. Reuniões feitas e pleito aceito por parte do Tribunal, em meados da década de 60, o TRT-2 tornou-se o segundo órgão do país a receber via banco. O primeiro tinha sido, pouco antes, o Tribunal de Justiça de São Paulo.



Em nome da associação, Totó, Maurício e os demais colegas lutaram pelos direitos dos servidores, garantindo aumento de salários, que eram feitos pelo próprio Tribunal, após votação. A dificuldade, porém, era conseguir o número adequado de juízes votando a seu favor. Totó e Maurício chegaram a ir para outro estado atrás de um juiz do TRT-2 para conseguir uma votação favorável. Eram, de fato, outros tempos.


Mas não era só de trabalho que vivia a associação e seus membros. Havia ainda festas, confraternizações, encontros… momentos em que os servidores aproveitavam para estreitar laços. E formar, assim, uma grande família, como, invariavelmente, é definida a relação que servidores e magistrados tinham naquela época, dentro do TRT-2.
Não à toa Luiz Antônio cita o juiz Hélio Tupinambá Fonseca, presidente do Tribunal entre 1954 e 1959, como pessoa de extrema importância em um difícil momento de sua vida: a perda de sua filha, em 1963, aos dois anos de idade. O magistrado ia aos sábados até Santos buscar Totó para passar com ele o dia na Hípica, da qual era sócio, em uma tentativa de animá-lo. Hélio Tupinambá, por sinal, é personagem constante na narrativa de diversos servidores aposentados, que atuaram no TRT-2 nas primeiras décadas de Regional. Sempre tinha ele uma participação senão decisiva, fundamental. Mas, marcadamente, muito humana.
No TRT-2 daquela época, os laços entre diversos servidores e magistrados eram estreitos. Maurício Lenine Pires revelou, recentemente, dois de seus padrinhos de casamento: o juiz Carlos de Figueiredo Sá (personagem de outra história de Totó) e o diretor-geral, Mário Pimenta de Moura.






O prédio da rua Rêgo Freitas
Toda história deixa uma marca. Alguma frase que não é esquecida. Alguma anedota que é sempre recontada. Alguma coisa. Talvez o ponto central de nossa relação com a história de Totó seja o edifício da rua Rêgo Freitas. Ou talvez esse seja só o meu (esta aqui que vos escreve). Mas é impossível não reconhecer o quanto aquele endereço marcou a vida de Totó e do Tribunal.
Aquele prédio do número 527 da Rêgo Freitas tornou-se sede do TRT-2 em 1957 – mesmo ano da nomeação de nosso entrevistado no Tribunal. Ali um jovem Luiz Antonio entrou, aos 18 anos.
Na rua Rêgo Freitas, Totó conheceu diversas pessoas. E fez amigos. Ele aprendeu a fazer o seu trabalho bem-feito, a gostar de ser servidor público e tentar ser – sempre – o melhor profissional possível. Mas não foi só. Ao longo desses anos, naquele endereço, Totó presenciou muito mais do que a evolução da Justiça do Trabalho em São Paulo. Ele presenciou a história de nosso país.
O governo militar e a Justiça do Trabalho em São Paulo
Os anos de governo militar foram muito marcantes para Luiz Antonio de Toledo Leite.
No prédio da Rêgo Freitas, Totó foi testemunha de muita coisa: fuga de advogados e dirigentes sindicais da polícia política, prisões dentro do Tribunal, aposentadorias pelo AI-5, ameaças de bomba no prédio. Luiz Antonio acompanhou também, e de perto, a famosa Batalha da Maria Antônia, entre alunos da USP e do Mackenzie. A localização do Tribunal, naquela região central, próximo à rua Maria Antonia, permitia isso.








Contribuía para todo esse movimento dentro do prédio o fato de que ali no centro, na rua de trás, na verdade, estarem dois pontos importantes para a juventude e a intelectualidade de esquerda: o bar Redondo e o Teatro de Arena, ambos na pequena rua dr. Teodoro Baima. Ambos a poucos metros de distância da saída do estacionamento do prédio do Tribunal. Ambos bastante vigiados pela polícia e pelo governo.










E se não bastasse isso, em frente ao Tribunal, na própria Rêgo Freitas, número 530, no mesmo prédio onde, desde 1970, está situada a sede do Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo (com seu famoso auditório Vladimir Herzog, palco de diversas reuniões de organizações em prol da anistia e da luta contra a ditadura militar naquele período), ficava, segundo Totó, a sede da Frente Nacional do Trabalho, órgão criado em 1958 pelo advogado trabalhista Mário Carvalho de Jesus e pelo arcebispo de Santo André, dom Jorge Marcos de Oliveira, que teve grande importância em movimentos grevistas da época, em especial na greve de Perus, uma das mais longas da história (que se estendeu de 1962 a 1969). Conta Luiz Antonio que a grande militância que havia de órgãos de oposição à revolução fazia reuniões no local.
No mesmo prédio também, o apartamento E-19 abrigava freis da Ordem dos Dominicanos, ordem religiosa que era muito próxima à Ação Libertadora Nacional (ALN), cujo líder era Carlos Marighella. Apenas para se ter uma ideia, Frei Ivo, um dos moradores do E-19, estava presente na emboscada que levou ao assassinato de Marighella, em 1969. Os dominicanos ainda tinham uma livraria ali próximo, a Livraria Duas Cidades, na rua Bento Freitas, que também dava apoio à ALN.



Fato interessante que Luiz Antonio conta é a existência de observadores informais dentro do próprio TRT. O juiz Sergio Mazzilli, sobrinho de Ranieri Mazzilli, presidente da Câmara dos Deputados que por duas vezes assumiu a Presidência da República na década de 60 (na primeira, no lugar de Jango, após a renúncia de Jânio. Na segunda, novamente no lugar de Jango, ao declarar vazia a Presidência, naquele 31 de março de 1964), foi um deles. Mazzili, servidor à época, ligava de um orelhão ali perto, ao tio em Brasília, contando tudo o que acontecia aqui por São Paulo. Sergio Mazzilli foi juiz de primeira instância na 2ª e na 15ª Região. Faleceu em 1990. Hoje em dia, dá nome a um fórum do TRT-15, na cidade de Votuporanga.
Entre um causo e outro
Mas… “afora os momentos de tensão vividos em consequência dos 21 anos de ditadura militar”, a vida de Luiz Antônio no Tribunal foi marcada também por divertidas histórias.
Luiz Antônio foi servidor da Junta de Conciliação e Julgamento de Campinas. Aos 20 anos, com cara de menino, foi nomeado diretor de secretaria (por merecimento, como faz questão de frisar). O juiz da junta era Roberto Mário Rodrigues Martins, que presidiu o TRT-2 entre 1976 e 1978.
Foi Campinas também o cenário de duas maravilhosas histórias contadas por Totó: a primeira sobre sua chegada à cidade. Com rosto de menino, em seu primeiro dia como novo diretor de secretaria da única junta de conciliação do local, Totó chegou a Campinas faltando poucos minutos para o meio dia, quando bateu à junta. Quem o atendeu, sem saber de quem se tratava, gritou do outro lado: “É só depois do meio-dia!”. Totó não se fez de rogado: “Mas o novo diretor de secretaria aqui sou eu”. Estava iniciada uma nova fase em sua carreira. Esse período duraria cinco anos (1959-1964).

A segunda história é sobre uma Romi-isetta, pequeno carro de dois lugares com formato oval que levava Luiz Antonio de São Paulo, onde morava, a Campinas, onde trabalhava. Junte Totó, Romi-isetta, um padre e o juiz-presidente da Junta. Não é preciso muito para entender que esses ingredientes garantem boas risadas.
Com muito bom humor, Totó ainda conta que, na época da Rêgo Freitas, já morando em Santos, estacionava essa mesma Romi-isetta próximo ao tribunal e, nos dias de chuva forte, tinha que ir longe buscá-la, pois o carro, extremamente leve, era carregado pela força das águas.



Uma fase em São Paulo, outra em Santos
Totó atuou em São Paulo entre 1964 e 1969. Foi diretor da 22ª Junta de Conciliação, ainda no prédio da Rêgo Freitas (junta que, por sinal, ajudou a instalar). Por aqui, trabalhou muito. Mas nunca deixou de aproveitar os momentos com os colegas. Participou de festas, confraternizações, passeios ocasionais a bares do centro, muito famosos à época. É o caso da “Som de Cristal“, que ficava no número 474 da rua Rêgo Freitas.
O local foi, durante muito tempo, um dos melhores espaços para se dançar gafieira na cidade. Era também o lugar em que Caetano, Gil e cia mostravam toda sua tropicalidade. Foi lá que gravaram, em 23 de agosto de 1968, o programa “Tropicália ou Pannis et Circenses”, que iria ao ar na TV Globo, e que reuniu 2000 pessoas para assistir à festa ao vivo. Apenas como curiosidade: naquele 23 de agosto, falecia o cantor Vicente Celestino, que também participaria da gravação, mas faleceu, horas antes, vítima de um infarto, no hotel Normandie. Foi por isso que Caetano e Gil se atrasaram para o show. Choravam a morte do amigo.



Nessa época, Totó já residia em Santos, cidade para a qual se mudou em 1965. Simultaneamente, fazia faculdade em São José dos Campos. Eram três cidades, no mesmo dia. “E ainda por cima de ônibus”, já que o servidor não possuía carro na época. “Eram tempos difíceis de ordenado”, relembra.
Em 1969, conseguiu finalmente sua transferência para a cidade litorânea: tanto do curso de direito quanto de lotação. Foi assim que chegou a 2ª Junta de Santos, ao lado do juiz Nelson de Oliveira Medeiros (de quem a servidora Ivone Belfort Ribeiro D’Arantes Medeiros, personagem da edição 2015/2016 do projeto “História Oral” é viúva).

Em Santos, atuou como diretor por 21 anos. E enfrentou enormes dificuldades. Teve que pedir funcionário emprestado para a prefeitura e enfrentar uma advocacia bastante combativa. Mas aprendeu a lidar com as adversidades e as superou. Tem orgulho de falar que é sempre lembrado, por colegas advogados de seu tempo, como o melhor diretor de secretaria que Santos já teve.


Foi na cidade também que perdeu um grande amigo, o baiano Dante Leonelli. Dante era um famoso advogado trabalhista de Santos, da área sindical. Foi eleito deputado federal, mas teve seu mandato cassado e seus direitos políticos suspensos em 1967. Foi perseguido durante a ditadura militar, tendo sido preso, inclusive, por possível ligação com o Partido Comunista.
Dante faleceu em agosto de 1975, dentro do Fórum de Santos, no momento em que realizava suas razões finais na 3ª Junta de Conciliação. Totó tinha conversado com o amigo momentos antes de este entrar na sala de audiência. E subiu às pressas para tentar socorrê-lo. Infelizmente, não conseguiu. Foi um infarto fulminante. Totó ainda ajudou a colocá-lo na mesa de audiência para aguardar a polícia. Dante Leonelli dá nome, hoje em dia, a uma rua da cidade de Santos. Seu filho, Domingos Leonelli Netto, ex-deputado federal constituinte, foi, ao lado de Dante de Oliveira e Ulysses Guimarães, um dos líderes da campanha “Diretas Já”.





Uma nova fase: a aposentadoria
Em 1990, aos 53 anos, Luiz Antônio aposentou-se, após 35 anos de serviços prestados à Justiça do Trabalho. Com a aposentadoria, seu cargo de chefe de secretaria, que era efetivo até então, foi extinto.



Totó seguiu para um período de dez anos em Curitiba, onde descansou e tentou “espairecer a cabeça”, como conta. Tinha perdido, recentemente, um filho, em um grande acidente de carro.
Após o período de dez anos, retornou a Santos, onde vive até hoje ao lado da esposa, a advogada Sônia Maria Toledo Leite, sua companheira há mais de 50 anos, e da cachorrinha Vivi, uma shih tzu branca e preta, que faz algumas participações especiais em nosso vídeo.




Um encontro que nos levou a um incursão pelo centro
Conversar com Totó é uma experiência encantadora. Estar com ele é também entender, em partes, o que somos hoje, como membros da Justiça do Trabalho da 2ª Região.
Ele nos contou histórias que remetiam a pessoas já por nós conhecidas, mas com as quais ainda não havíamos feito qualquer relação ou contato. Em alguns casos, apresentou-nos a novos e fantásticos personagens, como Maurício Lenine Pires, aqui já citado, “o melhor datilógrafo de audiência que a Justiça do Trabalho já teve”, segundo Totó. Maurício é o nosso servidor mais antigo. Aqui estava no que consideramos o primeira dia de trabalho das juntas de conciliação do antigo Conselho Regional do Trabalho, em 1º de agosto de 1941. Trabalhou por 35 anos na 6ª Junta de Conciliação da Capital.
Totó ainda aprofundou informações. Desvendou detalhes. E nos deixou extremamente curiosos e envolvidos com um passado tão distante (afinal, são vários os pontos com os quais não podemos mais fazer conexões), mas, ao mesmo tempo, tão próximo. E fez-nos querer entender mais e conhecer (ainda) mais sobre nosso próprio passado institucional.
E assim, tomados por uma curiosidade inerente ao trabalho, mas por uma vontade também de tentar compreender aquele momento e descobrir os resquícios que ainda existem pelo caminho, surgiu a ideia de fazermos uma incursão pelo centro, passando por todos os prédios que abrigaram a Justiça do Trabalho da 2ª Região na cidade de São Paulo.
O objetivo era tirarmos fotos dos prédios da capital. Afinal, de vários deles não tínhamos qualquer registro. Foram mais de 9 km de caminhada em seis horas de percurso. Mais de 700 registros fotográficos. Andando pelo centro, localizando prédios, tirando fotos e entrando em contato, quando possível, com alguém que pudesse nos ajudar a descobrir como era aquele prédio que víamos ali, mas em outros tempos.
Foi dessa forma que descobrimos que o prédio da Quirino de Andrade foi, muito provavelmente, demolido em algum momento do passado. Que chegamos à conclusão de que a busca por prédios se fazia sempre ali pertinho (afinal, são todos muito próximos!). E assim, pudemos conhecer, em uma tarde de imersão no centro de São Paulo, os diversos prédios que abrigaram o TRT-2, locais que tão importante foram para a nossa história.
Registramos prédios reformados e outros absolutamente abandonados. Vimos marcas do passado. Mas também alguns que nada tinham para nos “contar”. E tivemos dó. Pena pelo fato de a nossa história – e a própria história da cidade – ser tão pouco preservada. E, ao mesmo tempo, ficamos felizes por termos conseguido fazer um percurso que nos permitiu conhecer muito mais de nós mesmos, graças às breves histórias e pequenas evidências que conseguimos reunir ao logo do tempo. Não temos como saber como as coisas eram naquela época. Mas deve ter sido incrível.



















E foi assim também que, em um clima de interesse, saudosismo e extrema curiosidade, chegamos ao ponto central da história de Luiz Antônio de Toledo Leite. E motivo principal, ainda que não evidenciado, de nossa incursão pelo local. Quase ao término de nosso roteiro, chegamos ao número 527 da rua Rêgo Freitas, ponto de partida de nossa história,
Diante daquele prédio, permanecemos parados. Imaginando como aquele edifício de 10 andares, com ar tão residencial, abrigou um tribunal inteiro. E não só tudo o que temos hoje na Consolação. Mas o que temos na Consolação, no Millenium, na Rio Branco, nos galpões e nos três fóruns da capital (Ruy Barbosa, Zona Sul e Zona Leste). Quantos funcionários deveríamos ter? Em uma breve conta, levando em consideração informações esparsas, chegamos a cerca de 100. Tão diferente do que temos hoje.




Histórias que merecem ser contadas
Nosso encontro com Luiz Antonio de Toledo Leite foi muito produtivo. Ao todo, foram quase três horas de entrevista, que renderam diversas histórias. Muitas delas que, infelizmente, não poderão entrar no vídeo final por pura falta de tempo, mas que merecem um espaço todo especial. Histórias que ficaram guardadas na memória de uma servidor que muito se dedicou à Justiça do Trabalho. E que ainda serão contadas. Mas que já nos ajudam a pensar em projetos futuros para podermos utilizá-las de um jeito que ganhem o destaque que tanto merecem.
Luiz Antonio de Toledo Leite trabalhou duro, em uma época com pouca estrutura, poucos funcionários e muito a ser feito. Arregaçou as mangas para aprender e ajudar a desenvolver aquele pequeno órgão do Poder Judiciário que já apresentava tanto potencial. Mesmo sendo o filho mais novo do presidente, fez questão, durante seus 35 anos de atividade, de justificar suas conquistas por meio de resultados. Transformou o TRT-2 em sua segunda casa – fosse a primeira em São Paulo ou em Santos.
Durante esses diversos meses que separaram nossa entrevista, em janeiro, da real publicação, em dezembro, conversamos com ele diversas vezes. Sempre simpático, bem-humorado e muito interessado em nos ajudar. Assim como sua esposa, Sônia.
Esta aqui é uma pequena homenagem que fazemos a alguém que tanto se dedicou a nosso órgão. Simples e de coração, mas que, confesso, não consegue revelar toda a graciosidade desse servidor.
Totó é uma daquelas figuras que precisam ser conhecidas por servidores e magistrados do TRT-2. É a prova cabal de que, na verdade, é você quem decide sua própria trajetória dentro do Tribunal. E que, por mais que estejamos aqui para trabalhar, é possível construir uma história bonita e muito divertida. Melhor ainda se conseguirmos deixar um belo legado e podermos contar tudo isso para as próximas gerações.

Memórias Trabalhistas é uma página criada pelo Centro de Memória do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, setor responsável pela pesquisa e divulgação da história do TRT-2. Neste espaço, é possível encontrar artigos, histórias e curiosidades sobre o TRT-2, maior tribunal trabalhista do país.
Acesse também o Centro de Memória Virtual e conheça nosso acervo histórico, disponível para consulta e pesquisa.
Muito legal o trabalho feito pelos nossos colegas. Interessante e muito importante.
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Agradecemos a visita à página “Memórias Trabalhistas”.
Conhecer a nossa história institucional é extremamente importante para compreendermos quem somos hoje. E impossível seria tratarmos de nossa trajetória sem falarmos das pessoas que passaram pela instituição, que participaram da construção da história do Tribunal.
Acreditamos que o trabalho de história oral seja uma forma interessante de preservarmos nossa memória e trazermos à luz de nossos dias acontecimentos e personagens que, por alguma razão, possam ter caído no esquecimento.
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