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PRESIDENTES DO TRT-2: ROBERTO MÁRIO RODRIGUES MARTINS

Ele foi juiz-presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de Campinas por 13 anos, quando a localidade ainda possuía apenas uma única unidade judiciária. Era famoso na região. Sua paixão pela cidade era tanta que acabou por adotá-la como sua, e por lá ficou, mesmo depois de aposentado.

Foi também o primeiro juiz concursado a ser eleito presidente do TRT-2. E tinha verdadeiro orgulho de seu feito.

Foi ainda o magistrado responsável por presidir a audiência de conciliação do primeiro dissídio coletivo de greve depois do Ato Institucional 5, de 1968, que teve Lula como um dos personagens centrais, já no fim dos anos 1970. Isso quando Lula ainda não era Lula, apenas Luiz Inácio, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema.

Foi ainda o marido de Elisa, o pai de Silvia e de Flavia, avô de Juarez, Roberta, Caio e Marcos e bisavô de oito crianças.

A série “Presidentes do TRT-2” fala hoje sobre Roberto Mário Rodrigues Martins, décimo primeiro magistrado a dirigir a Justiça do Trabalho da 2ª Região.

Ele queria trabalhar

Nascido na cidade de Santos (SP), em 15 de fevereiro de 1926, Roberto Mário Rodrigues Martins é filho de Mário Martins (nascido em 23 de maio de 1892) e Jandyra Rodrigues (depois Machado de Oliveira, no segundo casamento – nascida em 10 de março de 1906). Seu nascimento foi anunciado na revista paulista “A Cigarra”.

Único menino dentre os três filhos (uma de suas irmãs, Wilma, chegou a ser, inclusive, servidora do TRT-2, atuando na 22ª JCJ de São Paulo; a outra chamava-se Gilda), Roberto Mário, o filho mais velho, soube desde cedo que precisaria batalhar para ajudar sua família. Dona Jandyra, muito à frente de sua época, separou-se do primeiro marido quando os três filhos ainda eram bem pequenos e rumou para São Paulo, onde conheceu Alfredo Ellis Machado de Oliveira, que será um verdadeiro pai para as crianças.

Roberto Mário Rodrigues Martins com a mãe, Jandyra, e as irmãs, Wilma e Gilda. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Roberto Mário estudou no Liceu Rio Branco e depois no Colégio São Luiz (até então restrito para meninos), onde cursou o ginásio. Contam suas filhas que, devido às dificuldades de tempos em que separação e mãe solteira eram elementos que causavam furor na sociedade, as crianças tiveram que ficar em internatos. Era a única forma que dona Jandyra enxergava para conseguir trabalhar e sustentar os filhos. Talvez isso também tenha influenciado a vida de Roberto Mário, que, ao longo da vida, afirmou repetidas vezes o quão orgulhoso era da história de sua mãe.

Retrato do time de futebol do Colégio São Luzi em São Paulo. Roberto Mário era o goleiro. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

O jovem Roberto parou de estudar alguns anos, acreditando, em suas próprias palavras, “que poderia ganhar dinheiro e vencer na vida sem muito estudo”. Atuou durante três anos como bancário: durante um ano, foi office boy no Banco Industrial de São Paulo (depois adquirido pelo Banco Econômico da Bahia, depois Banco Brasileiro de Descontos S/A., hoje Bradesco). No Bradesco, foi um dos primeiros operadores de máquinas de Contas Correntes (em sua época, eram apenas dois, como contou determinada vez ao Centro de Memória).

Torcedor do Santos, aproveitava um pedaço do dinheiro que sobrava para comprar passagens de trem e ingressos para os jogos do time de coração. Nunca foi fanático pelo esporte, mas gostava de assistir ocasionalmente a uma partida.

Enveredou para o campo do direito quando seu padrasto, Alfredo Ellis Machado de Oliveira (sobrinho do historiador Alfredo Ellis Junior, que escreveu diversos livros sobre a história de São Paulo), advogado trabalhista, formado na turma de 1924 da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, possibilitou que com ele trabalhasse em seu escritório, mas havia uma condição: o retorno aos estudos.

Estudou os três anos do curso clássico no período noturno do Liceu Eduardo Prado. Finalizados os estudos, ingressou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, formando-se em 1954 – na que ficou conhecida como Turma do 4º Centenário.

Convite para a festa de formatura da Turma do IV Centenário. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

São seus contemporâneos nomes como: Mario Sergio Duarte Garcia (sobrinho do juiz Décio de Toledo Leite, presidente do TRT-2 no período 1957-1963, que foi servidor do Regional e, mais tarde, atuante advogado, presidente da AASP – Associação dos Advogados de São Paulo – e da OAB-SP – Ordem dos Advogados de São Paulo); Cássio Mesquita de Barros (importante advogado trabalhista); Nicolau dos Santos Netto (que fez carreira no Ministério Público, tornando-se desembargador do TRT-2, em 1981, e presidente do Regional entre 1990 e 1992). Além dos que serão seus colegas de 2º Concurso da Magistratuta:  Waldermar Thomazine (magistrado do TRT-2 entre 1961 e 1977); Wagner Drdla Giglio (que acabou por fazer uma carreira no estado do Paraná, onde chegou a ser vice-presidente do TRT-9, regional instalado em 1976, após a separação do estado da jurisdição do TRT-2); e José Amorim (primeiro juiz-presidente da 1ª Junta de Conciliação e Julgamento de São Bernardo do Campo – e que hoje dá nome ao fórum trabalhista da cidade).

Página do livro produzido pela comissão de formatura da Turma de 1954. No alto, o nome de Roberto Mário Rodrigues Martins. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Conta o amigo Odonel Urbano Gonçales, magistrado aposentado do TRT-2, que, depois de formado, Roberto Mário viajava a São Paulo todos os anos para encontrar seus colegas de turma. Fez isso enquanto a saúde permitiu. Mas comentava sempre, em tom melancólico, o quanto, cada ano mais, a turma diminuía.

Roberto Mário colou grau em 25 de janeiro de 1955. Seu objetivo, porém, não era advogar. Sonhava em ser juiz. Por isso, quando em maio de 1955 aconteceu a abertura do 2º Concurso da Magistratura do TRT-2, não teve dúvidas: candidatou-se, ao lado de 108 outros nomes. Estudou muito. Passou dias e noites se preparando para as provas que se aproximavam. Sabia o quanto tudo aquilo seria decisivo para sua vida. E importantíssimo para sua vida de recém-casado.

No fim, 51 foram aprovados. Em outubro de 1955, poucos meses após se formar, Roberto Mário era aprovado, na décima colocação, no segundo certame que o TRT-2 fazia para a seleção de magistrados.

concurso da magistratura do TRT-2, Neusenice de Azevedo Barretto Küstner, primeira juíza do TRT-2
Lista de aprovados do III Concurso da Magistratura do TRT-2. Em 10º lugar, Roberto Mário Rodrigues Martins. Fonte: acervo TRT-2.

Além de Waldemar Thomazine, Wagner Drdla Giglio e José Amorim (da Turma do IV Centenário), são de seu concurso nomes como Antonio Lamarca (o primeiro colocado do certame, presidente do TRT-2 nos anos de 1981 e 1982); Francisco Garcia Monreal Junior (que virá a ser o primeiro presidente do TRT-15, quando de sua instalação, em 1986); e Neusenice de Azevedo Barreto Küstner (a primeira magistrada concursada da Justiça do Trabalho – que também seguirá para o TRT-15, em 1986).

Nelson Virgílio do Nascimento, membro do Ministério Público desde 1951, também foi um dos classificados. Apesar da 20ª colocação, não assumirá, mas virá a ser juiz do tribunal, pelo Quinto Constitucional, a partir de 1968, sendo eleito vice durante a administração de Roberto Mário e depois seu sucessor na presidência, no biênio 1978-1980.

À essa época, Roberto Mário já era casado com Elisa (desde 1953), com quem terá duas filhas: Silvia (nascida em março de 1955) e Flavia (nascida em janeiro de 1957). A esposa, suas meninas – e seus descendentes – passaram a ser, lado a lado da Justiça do Trabalho, os grandes vetores de sua vida. 

Os primeiros dias de “angústia”

Roberto Mário Rodrigues Martins foi nomeado por decreto do dia 26 de janeiro de 1956 – um ano e um dia depois de sua colação de grau. Tomou posse e entrou em exercício no dia 31 de janeiro seguinte.

A rapidez com que as coisas aconteceram em sua vida profissional fez com que Roberto Mário sequer tenha tido tempo de fazer sua inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil, algo feito apenas após sua aposentadoria, como lembra o amigo Odonel.

Roberto Mário, porém, já tinha ampla experiência na advocacia, em decorrência dos anos trabalhados ao lado de seu padrasto, Alfredo Ellis, que havia sido seu grande professor. Todo o aprendizado, porém, não foi suficiente para preparar-lhe para o dia a dia da magistratura, em especial no começo.

“Aquela angústia do juiz de decidir corretamente, acertadamente, não é? Então! Isso existe na carreira de todo magistrado que quer ser um bom juiz, que quer decidir corretamente. É muito difícil.”

Roberto Mário Rodrigues Martins, em entrevista concedida ao TRT-2, em 2002.

Era um início muito remoto, por assim dizer. Não bastasse toda a “juventude” da Justiça do Trabalho, que, pouco mais de uma década antes havia sido criada – e anos depois reformulada – , ainda havia toda a novidade relacionada aos novos concursos. Os juízes, que desde 1953 eram concursados e assumiam como substitutos, agora aprendiam – e desenvolviam – técnicas para a realização de seus trabalhos e também para a administração das novas unidades que eram, pouco a pouco, criadas.

Levando-se em consideração os dois concursos realizados (entre os anos de 1953 e 1955), Roberto Mário Rodrigues Martins foi o 25º candidato nomeado para o TRT-2 (15 tinham sido nomeados no primeiro concurso).

Não havia Escola Judicial. Não havia quem orientasse, exceto um ou outro que o fazia durante o trabalho, de maneira bastante informal.

Aos 31 anos e com poucos meses de formado, Roberto Mário já estava encarregado de redigir sua primeira sentença, o que foi, para ele, bastante difícil: “A agonia de dar a primeira sentença, saber se estava certa, ou não estava, aquela angústia”, relembrou em entrevista concedida ao TRT-2, no ano de 2002.

Segundo Silvia, a filha mais velha do magistrado, Roberto Mário tinha receio de errar. De ser um mau julgador. De equivocar-se. De ser injusto.

Apesar da pouca experiência como advogado formado, Roberto Mário havia trabalhado durante muitos anos no escritório de advocacia de seu padrasto, o que lhe havia dado sólida base para o início de suas atividades judicantes. Mesmo que sua orientação pudesse ser tendencialmente enviesada (afinal, advogava para empresas), ele sabia que era preciso buscar a imparcialidade. Mas também tinha certeza de que esse seria um de seus maiores desafios na vida dentro da magistratura.

roberto mario rodrigues martins

“Eu vim de um escritório de um advogado trabalhista, que era advogado de empresas, então eu naturalmente tinha aquela tendência para decidir alguns casos que estava em dúvida, favorável ao empregador. Mas, veja bem, até o meu padrasto quando eu discutia com ele os casos para me auxiliar, ele falava: ‘Você pode defender esse entendimento como advogado, mas, como juiz, não, que aí tem o empregado. Veja bem’. A formação que ele me deu, felizmente, foi essa.”

Roberto Mário Rodrigues Martins, em entrevista concedida ao TRT-2, em 2002.

E isso muito ajudou Roberto Mário. O magistrado tornou-se minucioso na análise de seus processos. “Ele não decidia sem ter absoluto conhecimento do que se dizia no processo, nas provas dos autos, do que disse o autor, do que disse o réu, os laudos periciais”, relembra Odonel Urbano Gonçales, que usou exatamente a forma de agir de Roberto Mário como fio condutor de sua futura carreira na magistratura (que se iniciou na década de 1980).

Aos poucos, claro, Roberto Mário foi ficando mais tranquilo em suas atividades rotineiras. Mas sempre preocupado com o poder de suas decisões. Para ele, a função de julgar era “uma missão quase divina”, como explicou determinada vez: “Uma vez eu perguntei a um juiz: ‘Por que quando o juiz vai atuar, ele vai exercer a sua missão de julgar, ele põe aquela vestimenta preta?’. E ele respondeu: ‘É porque, segundo o que nós ouvimos, aprendemos, aquilo é para distinguir um ser humano de outro, para ele se colocar acima e poder julgar o seu semelhante, está entendendo? Ele se diferencia dos demais. Porque eu não posso julgar você, nem você a mim. Então, com aquela toga de juiz, exatamente naquele momento, ele está acima dos demais seres humanos, e ele pode então decidir se ele tem razão ou se ele não tem razão, e dizer o direito’. Era isso o que Roberto Mário levava para si.

Pasta funcional do juiz Roberto Mário Rodrigues Martins. Fonte: acervo TRT-2.

O magistrado não só entendia a importância de seu trabalho, como também tinha a absoluta certeza de que qualquer erro poderia modificar substancialmente a vida de quem estava sendo representado nos processos. Por isso mesmo, lia muito e estudava minuciosamente cada demanda que se apresentava em sua frente.

O tempo que investia em suas decisões e a dedicação com que se empenhava para analisar e discutir as questões que chegavam as suas mãos foram percebidos. Ainda em 1957, com pouco mais de um ano de atividade, e atuando como juiz substituto na 9ª Junta de Conciliação e Julgamento de São Paulo, seu nome já aparecia nos jornais em discussões acaloradas acerca do direito do trabalho, que ganhava corpo e maior visibilidade.

Nos primeiros anos no TRT-2, Roberto Mário foi designado para trabalhar em diversas juntas de conciliação da 2ª Região, inclusive na de Santos, sua cidade-natal. Mas essa mudança constante, tão característica na vida de um juiz substituto, duraria pouco.

Em 28 de fevereiro de 1957, por merecimento, o magistrado chegou ao cargo de juiz-presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de Campinas, única então existente na cidade. Incialmente lotado em outra unidade, Roberto Mário pediu prontamente sua remoção para Campinas, onde a irmã gêmea de sua esposa já residia. Foi para lá que o magistrado rumou, com toda a família (a filha mais velha, Silvia, tinha apenas dois anos à época, e Flavia era uma pequena bebê). Lá atuou por treze anos. Mas nunca mais deixou a cidade. Tornou-se um campineiro de coração. 

O juiz Roberto Mário Rodrigues Martins com as filhas, Silvia e Flavia, em registro de 1957. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Presidente da JCJ de Campinas

Foram 13 anos de vida judicante em Campinas. Ali teve a seu lado, entre os anos de 1959 e 1964, o servidor Luiz Antônio de Toledo Leite, filho do juiz de tribunal Décio de Toledo Leite, presidente do TRT-2 entre os anos de 1957 e 1963. Totó, como é conhecido, atuou na junta de Campinas como diretor de secretaria. Bastante jovem, pegou de surpresa o juiz. Em tempos de nomeações por indicação, era natural que parentes de magistrados de segundo grau andassem pelos corredores dos tribunais. Foi assim com Luiz Antônio. Mas o servidor demorou pouco tempo para mostrar o seu valor. Como conta a filha de Roberto Mário, Silvia: “Foi uma grata surpresa para o meu pai”. E os dois se deram muito bem, no final.

O servidor Luiz Antônio de Toledo Leite (à esquerda), já diretor de secretaria da única junta de conciliação de Campinas, com colegas da época (Fonte: fundo Luiz Antonio de Toledo Leite / acervo TRT-2).

Outra pessoa que atuou ao lado de Roberto Mário, como chefe de secretaria da Junta de Campinas, foi a então servidora Eliana Felippe Toledo, mencionada recentemente, em artigo de autoria de Agostinho Toffoli Tavolaro, advogado trabalhista, membro da Academia Paulista de Direito do Trabalho (APDT), publicado no livro “Sentimentos na pandemia, pensamentos da academia”.

Eliana entrou no TRT-2 como servidora em 1962, atuando na JCJ de Campinas. Ali, atuou como chefe de secretaria até 1975, quando foi aprovada no V Concurso da Magistratura. Faria sua carreira em São José dos Campos e, a partir de 1980, em sua cidade-natal, Campinas, inclusive após a criação do TRT-15, quando optou por permanecer no novo Regional. Em 2002, foi eleita presidente da 15ª Região Trabalhista, tornando-se a primeira mulher a assumir a corte. Aposentou-se em dezembro de 2005.

Sua relação com Roberto Mário foi de grande amizade, “daquele tipo para todas as horas”, como conta. Amizade essa que começou nos corredores da Junta de Conciliação de Campinas e se estendeu ao longo dos anos. Segundo Eliana, no ambiente de trabalho, Roberto Mário era uma pessoa “muito cordata, acessível e educada”, e que tratava muito bem os funcionários: “Mas era bravo quando precisava ser”. A desembargadora aposentada lembra bem do quanto Roberto Mário era minucioso e “redigia sentenças maravilhosas” e revela que o magistrado foi uma grande referência em sua vida profissional.

A desembargadora aposentada Eliana Felippe Toledo em registro de 2019 (fonte: Amatra XV), com alguns dos presidentes do TRT-2 e, à direita, com o ministro do STF, Marco Aurélio (fonte: fundo Eliana Felippe Toledo / acervo TRT-2).

Durante seus tempos de Campinas, Roberto Mário lidou com processos que tiveram grande repercussão, como é o caso daqueles envolvendo o grupo J. J. Abdalla. Não era raro encontrar seu nome nos jornais do estado.

Reportagens do jornal “O Estado de S.Paulo” (28/12/1957 e 7/5/1958, 16/8/1959 e 18/8/1966) destacam ações que tiveram como juiz Roberto Mário Rodrigues Martins. Fonte: acervo Estadão

Seu trabalho seria novamente reconhecido. E a oportunidade de sua nomeação para a segunda instância veio graças ao governo militar. Em tempos de apenas 17 juízes de tribunal, todas as vagas contavam.

Um novo juiz para a segunda instância do TRT-2

Em 10 de setembro de 1969, Roberto Mário Rodrigues Martins foi promovido, por merecimento. Tomou posse e entrou em exercício em 16 de setembro. Na solenidade de posse, foi saudado pelos juízes Carlos Bandeira Lins e Wilson de Souza Campos Batalha, e pelo procurador José Vieira, que, em discurso, exaltou o “invejável saber jurídico que se soma à larga experiência de que é possuidor, especialmente no campo do direito trabalhista”. O presidente da época já era Homero Diniz Gonçalves, que estava no cargo desde 1967 (e ficou até 1976).

Naquele momento, o Tribunal era composto por 17 juízes, divididos em três turmas. Roberto Mário foi designado para atuar na 1ª Turma, tendo dela sido presidente, anos depois. Foi ali, inclusive, que o magistrado conhecera um dos grandes amigos de sua vida, Odonel Urbano Gonçales, então secretário da 1ª Turma, mas que acabou por se tornar assistente de Roberto Mário ao longo de sua carreira e, décadas depois, sócio em um escritório de advocacia.

Odonel foi servidor do TRT-2 entre 1962 e 1980, quando, após prestar o VI Concurso da Magistratura, foi aprovado e nomeado juiz substituto: “Aí começou uma amizade profissional, pessoal, de 52 anos”, conta o juiz aposentado.

Roberto Mário era uma grande referência para Odonel, em especial no que viria a ser sua futura carreira na magistratura. A forma como atendia as pessoas, seu jeito polido e o “absoluto equilíbrio nas decisões que proferia” eram marcas registradas. “O dr. Roberto Mario sempre foi uma pessoa educada. Atendia partes, advogados, quem quer fosse, que o procurasse, ele atendia. Conversava normalmente, sem aquela empáfia que a magistratura traz para algumas cabeças”, conta Odonel, ele próprio um magistrado.

Roberto Mário passou a ocupar a vaga do juiz Carlos de Figueiredo Sá, aposentado em virtude do Ato Institucional 5, de 1968, e que há mais de um ano costumava tirar licenças frequentes, muitas delas ocasionadas por perseguições políticas que sofria. As ausências constantes de Sá geraram alguns problemas, que foram evidenciados na posse de seu sucessor: 400 processos pendentes de julgamento, entregues por uma perua Kombi, na porta da casa do novo juiz de tribunal.

Roberto Mário não teve dúvida: “Simplesmente tirou um mês de férias para poder descarregar aquilo tudo. Como era um juiz muito minucioso, ele demorou para se livrar daqueles 400 processos e não conseguiu, nos 30 dias, fazê-los todos, mas é claro que deu uma boa diminuída, não é? Retornou às suas atividades, continuou recebendo processos das distribuições, como eram normais, semanalmente, e ficou com aquele rabicho, digamos assim, de processos durante um bom tempo”, lembra Odonel.   

O juiz Carlos de Figueiredo Sá, aposentado pelo AI-5. Fonte: acervo TRT-2.

Durante muitos anos após a criação da Justiça do Trabalho, os juízes não possuíam gabinetes. Os espaços reduzidos e as enxutas verbas não permitiam que isso acontecesse. As coisas começaram a mudar após a mudança da sede do Tribunal para o edifício da avenida Rio Branco, onde as condições eram um pouco melhores. “Criaram algumas ‘saletinhas’, minúsculas, de um metro quadrado no máximo, que passaram a servir de gabinete dos juízes”, conta Odonel.

Naquela época, também, se criou o cargo de assessor de juiz. Já existente há algum tempo, mas sem verba específica. Tudo ocorreu durante a gestão do juiz Homero Diniz Gonçalves, a partir de 1974, quando, aprovado o novo Regimento Interno, aconteceu também uma reestruturação dos cargos no Tribunal, além da reformulação do organograma do órgão. Uma espécie de Plano de Cargos e Salários da época.

Roberto Mário Rodrigues Martins ao lado de Marcos Manus, ambos da 1ª Turma do TRT-2, em registro do início dos anos 1970. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Foi nesse momento que Odonel, ainda assessor do juiz classista Marcos Manus (com quem Roberto Mário tinha grande afinidade, por sinal), pai do ministro do TST, falecido em 2022, Pedro Paulo Teixeira Manus, colocou-se à disposição de Roberto Mário, caso ele desejasse nomeá-lo seu assessor: “E ele aceitou. Nós nos conhecíamos já, mais ou menos bem. Eu trabalhei como assessor dele uns dois ou três anos porque aí ele foi eleito presidente do Tribunal”. A parceria foi mantida ainda por muitos anos.

Após tanta espera, a vitória

Em 1976, o presidente do TRT-2 era o juiz Homero Diniz Gonçalves. Homero estava no cargo há nove anos, já sendo o magistrado que mais tempo havia ficado à frente do Regional. Recorde, por sinal, que nunca seria batido.

Homero era uma pessoa extremamente política. Tinha excelentes relações com membros do governo militar, sabia utilizar-se de sua posição e de seus contatos para obter melhorias para o Regional que chefiava. E foi astuto durante seu tempo na Presidência do TRT-2. Alterou o regimento interno diversas vezes, a fim de conseguir reeleger-se. Mas em 1976 não houve jeito.

O juiz Roberto Mário Rodrigues Martins (destaque, à esquerda), no Tribunal, em registro da década de 1970. No centro, o juiz Homero Diniz Gonçalves. Fonte: acervo TRT-2.

Roberto Mário Rodrigues Martins, por sua vez, havia sido eleito vice-presidente do TRT-2 em 1974 (para o biênio 1974-1976). E aguardava ansiosamente pela sua oportunidade. Queria realizar transformações que dissessem respeito à qualidade dos serviços prestados. Queria mudanças que estivessem relacionadas ao dever maior que um tribunal tem, o dever de bem julgar.

Foi uma vice-presidência difícil. Homero Diniz Gonçalves e Roberto Mário Rodrigues Martins eram muito diferentes. O primeiro, tinha a política como sua grande vocação. O segundo, a magistratura. Segundo Odonel, apesar de “muito civilizada”, a relação entre os dois magistrados limitava-se ao estritamente institucional. “Ele ia ajudando naquilo que era possível fazer como vice-presidente, despachando alguns recursos de revista, cuidando de um assunto aqui, um assunto lá, fazendo uma correição em uma junta de conciliação e julgamento”.

Sua intenção, no entanto, sempre foi concorrer. Queria dar o melhor para aquele Regional a que tanto se dedicava. Pessoa sensata e bastante equilibrada, como mencionaram alguns de seus amigos, Roberto Mário aguardava a eleição seguinte para tentar uma oportunidade. “Na próxima eleição, vou me candidatar a presidente e quem sabe ele não muda o regimento de novo, não é?”, lembra Odonel o que dizia o amigo.

E foi assim que, após um mandato de nove anos exercido pelo juiz Homero Diniz Gonçalves, Roberto Mário foi eleito. O primeiro magistrado concursado a assumir a Justiça do Trabalho da 2ª Região – algo de que tinha bastante orgulho, como não cansava de repetir à família e aos amigos.

Vinda de Campinas, a família esteve presente na solenidade de posse. Inclusive a mãe, Jandyra, e o padrasto, Alfredo Ellis. Sabiam o quanto Roberto Mário havia sonhado com aquilo. A filha mais velha, Silvia, estava, inclusive, grávida de seu primeiro filho. O primeiro neto também de Roberto Mário. Eram muitas emoções para um ano só.

Reportagens dos jornais “O Estado de S.Paulo” (1º/9/1976. Fonte: acervo Estadão) e “Folha de S.Paulo” (1º/9/1976 e 16/9/1976. Fonte: acervo Folha).

Para a vice-presidência foi escolhido o juiz Nelson Virgílio do Nascimento, que havia chegado ao TRT-2 em 1968, por meio do Quinto Constitucional, novidade instituída no mesmo ano. Vindo do Ministério Público da União, Nelson Virgílio do Nascimento havia também prestado o II Concurso da Magistratura, o mesmo certame de Roberto Mário, mas havia optado pela continuidade de atuação no MP, onde estava desde 1951.

No dia 4 de novembro de 1976, aconteceu um jantar em São Paulo em homenagem ao novo presidente, que reuniu, além de membros do Tribunal e da advocacia, a família de Roberto Mário. Dois dias depois, nasceu o primeiro neto, Juarez.

Em poucos dias, a primeira grande mudança

Quando Roberto Mário Rodrigues Martins assumiu o TRT-2, o Regional era formado por 71 juntas de conciliação e julgamento. Oito delas, porém, já estavam com seus dias contados na 2ª Região. Isso porque o TRT-9, criado em 1975, seria instalado apenas alguns dias após a posse de Roberto Mário na presidência da 2ª Região.

Registro feito na posse de Roberto Mário Rodrigues Martins como presidente do TRT-2. Fonte: acervo TRT-2.

Um dos primeiros atos de seu mandato, inclusive, foi acompanhar a instalação do TRT-9 (PR). Instituído no ano anterior pela Lei 6241/1975, o TRT da 9ª Região foi o primeiro regional criado desde a instalação da Justiça do Trabalho, em 1941.

Além do estado do Paraná, o TRT-9 passou a abarcar também o estado de Santa Catarina, pertencente, até então, ao TRT da 4ª Região (RS) e tinha como sede a cidade de Curitiba.

Naquele momento, o Paraná possuía oito juntas de conciliação e julgamento em funcionamento: quatro em Curitiba, uma em Ponta Grossa, uma em Londrina, uma em União de Vitória e uma em Paranaguá.

Reportagem do jornal “Gazeta do Povo” destaca a cerimônia de inauguração do TRT-9. Fonte: Hemeroteca da Biblioteca Nacional.

A criação do novo regional alterou não apenas a jurisdição do TRT-2, mas também fez com que diversos magistrados (a maior parte de primeiro grau) optassem por integrar o TRT-9, algo garantido pela Lei 6241/1975

Sete magistrados do TRT-2 acabaram por seguir carreira na 9ª Região: Pedro Ribeiro Tavares e Wagner Drdla Giglio (o primeiro com atuação no Paraná e o segundo em São Paulo – ambos que seguiram diretamente para a segunda instância do novo Regional). Além de Délvio José Machado Lopes (presidente da 2ª JCJ de Curitiba), Leonardo Abagge (3ª JCJ de Curitiba, que seria presidente do Regional entre 1988 e 1989), João Antônio Gonçalves de Moura (JCJ de Londrina), Ismael Gonzalez (JCJ de Paranaguá) e Célia Leite Salibe (JCJ de Ponta Grossa).

Apesar de não mais receber novos processos das unidades que viriam a fazer parte do TRT-9 desde o dia 1º de setembro, ainda sob a presidência de Homero (e durante o mandato de Roberto Mário como vice, portanto), a instalação do novo Regional aconteceu apenas após a troca de gestão no TRT-2. O novo presidente do TRT-2 participou da solenidade de instalação, ocorrida no dia 17 de setembro de 1976.

“O acontecimento, como parece compreensível, envolveu diretamente este Tribunal, especialmente no plano sentimental, considerando-se os fortes laços jurisdicionais e afetivos que, estabelecidos e consolidados por décadas, uniram o estado de São Paulo ao Paraná.”

Roberto Mário Rodrigues Martins

Para permitir o funcionamento do novo tribunal trabalhista, a Lei 6241/1975 autorizava que os servidores do TRT-2 que tivessem cargos que atendessem ao estado do Paraná fossem transferidos para o TRT-9 (o mesmo valia para o TRT-4). O normativo, no entanto, não previa juízes substitutos, o que fez com o TRT-2 cedesse alguns de seus magistrados para auxiliar no funcionamento do novo regional. O mesmo aconteceria com o TRT-4.

Primeiros servidores do TRT-9. Fonte: livro “Registro Histórico dos 39 anos do TRT da 9ª Região”.

Essa não seria, porém, a única mudança na jurisdição do TRT-2 que Roberto Mário acompanharia de perto. Em 1977, a Lei Complementar 31, assinada pelo presidente Ernesto Geisel, criava o estado do Mato Grosso do Sul, com capital em Campo Grande. A cidade de Cuiabá permaneceu sendo a capital do novo estado do Mato Grosso. Naquela época, o (antigo estado do) Mato Grosso possuía apenas duas juntas: uma em Cuiabá (agora capital de Mato Grosso) e uma em Corumbá (pertencente ao estado do Mato Grosso do Sul). O novo estado do Mato Grosso do Sul não tinha, portanto, uma junta de conciliação em sua capital – e foi assim durante algum tempo.

Edição do dia 23 de julho de 1977 do jornal “Diário da Serra”. Fonte: Carolina Holland/G1 MT.

Apenas durante a gestão do sucessor de Roberto Mário que a questão, ainda que iniciada em 1977, teve um desfecho. Isso porque, apenas no fim de seu mandato seria publicada uma lei que criaria novas juntas de conciliação e julgamento na 2ª Região, sendo uma delas na cidade de Campo Grande.

Problemas – e a necessidade de novas unidades na primeira instância do Regional

Falta de juntas de conciliação, falta de pessoas, excesso de processos eram problemas antigos, enfrentados por todos os presidentes que haviam passado pela história da Justiça do Trabalho da 2ª Região. Claro, não seria diferente com Roberto Mário Rodrigues Martins. E o magistrado sabia disso.

No Relatório Anual de Atividades de 1976, o presidente fez questão de registrar que, já em seus primeiros momentos no cargo, mostrava-se preocupado. Em seu discurso de posse “firmou a convicção e determinação a que se achava imbuído, no sentido inabalável de realizar uma administração profícua, ativa e capaz de enfrentar a crise”, que diariamente se agravava, pelo “sempre crescente volume de ações ajuizadas, o que tem propiciado uma distribuição de cerca de 3000 processos por ano para cada junta de conciliação e julgamento da Capital, e uma distribuição média de 50 processos por semana, para relatar e revisar, para cada juiz de tribunal”.

Os números eram, de fato, bastante elevados. No ano de 1976, quando assumiu o TRT-2, as três Turmas do Regional receberam 13.193 novos processos (ante 12.186 do ano anterior), além de 550 processos distribuídos ao Tribunal Pleno (uma queda de seis unidades em relação ao ano anterior).

Já na primeira instância, apenas as 32 juntas de conciliação e julgamento de São Paulo receberam 102.644 novos processos. Somando-se aos processos distribuídos para as unidades fora da sede, 67.553, tem-se um total de 170.179, já excetuados os processos recebidos pelas juntas do estado do Paraná.

Apesar de o aumento em relação ao ano anterior poder ser considerado pequeno (0,7%), o número de processos de cada unidade de primeira instância da cidade de São Paulo era elevado: 3.207.

Em Santos, o cenário era o mesmo: cada uma das três unidades recebeu uma média de 3.028 novos processos.

Desde 1973, no entanto, a situação mais alarmante era a da cidade de São Bernardo do Campo. Com apenas uma junta de conciliação, São Bernardo recebia mais ações do que a média de novos processos recebidos pelas unidades da Capital, o que causava enorme preocupação.

A edição do dia 15 de janeiro de 1978 da “Folha de S.Paulo” evidenciava a situação. Segundo o jornal, apesar de o estado de São Paulo ser responsável por “cinquenta por cento dos feitos que, no país, se instauram, tendo em vista conflitos de interesses entre empregados e empregadores”, havia uma “inegável deficiência de órgãos existentes”. Para o jornalista Teófilo Cavalcanti Filho, professor de Introdução ao Estudo do Direito na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, e autor da coluna (uma das últimas que escreveria por sinal, já que faleceria no dia 13 de abril de 1978), a cidade de São Paulo possuía “simplesmente a metade das Juntas de que deveria dispor para atender, em níveis de normalidade, o volume pletórico de questões trabalhistas”. O periódico, porém, fez questão de registrar: as coisas assumiam “características de gravidade ainda maior” em São Bernardo do Campo, área de “enorme concentração operária”. Na mesma reportagem, Roberto Mário Rodrigues Martins falaria de seu pleito por novas juntas de conciliação e julgamento na 2ª Região, em especial na sede e no ABC, e a implantação de “um sistema de computação” (algo que já estava sendo realizado na Justiça Federal), que poderia “contribuir de maneira decisiva para o fluxo mais rápido das questões”.

À direita, a coluna Direito e Justiça, assinada por Teófilo Cavalcanti Filho no jornal “Folha de S.Paulo” (15/1/1978. Fonte: acervo Folha). À esquerda, operários da Ford, em registro feito na década de 1970, na fábrica localizada em São Bernardo do Campo (fechada no ano de 2021. Fonte: acervo Ford).

Apesar de o auge da situação em São Bernardo ter sido atingido no ano de 1975, quando a unidade da Região Metropolitana recebeu 6.970 novos processos (ante uma média de 3.186 das juntas da Capital), o número se manteria acima de cinco mil nos anos seguintes: 5.871, em 1976 (ante 3.208 da Capital); 5.852, em 1977 (ante 3.657 em São Paulo) e 5.426, em 1978 (ante 3.750).

“Achando-se a 2ª Região inserida na área geográfica nacional de maior desenvolvimento industrial, comercial e agropecuário, e que tem a mobilizá-lo a maior concentração e trabalhadores da América Latina, é natural que outra não fosse a perspectiva.

Portanto, o considerável aumento dos litígios, com repercussão em toda a estrutura administrativa e judiciária, longe de constituir surpresa, veio somente confirmar o que já era de fato esperado.”

Relatório Anual de Atividades de 1977.

A situação se normalizaria apenas em 1979, quando São Bernardo passou a contar com três juntas de conciliação e julgamento, abaixando para uma média de 1.850 processos por unidade (ante uma média de 4.038 na cidade de São Paulo, ainda em número de 32).

Criadas pela Lei 6563, de 19 de setembro de 1978, após a saída de Roberto Mário da Presidência do TRT-2, portanto, as unidades foram resultado de um enorme empenho do magistrado, que se deslocou inúmeras vezes a Brasília, principalmente ao Tribunal Superior do Trabalho (TST), com a intenção de falar sobre assuntos relativos ao TRT-2, em especial a instituição de mais turmas e a criação de novas juntas de conciliação e julgamento.

Ao todo, foram criadas 39 unidades de primeira instância, sendo 13 em São Paulo (da 33ª à 45ª JCJ); sete na Região Metropolitana, nas cidades de São Bernardo do Campo (2ª e 3ª JCJs), Barueri, Diadema, Franco da Rocha, Guarulhos (2ª JCJ), Itapecerica da Serra; duas na Baixada Santista, na cidade de Cubatão (1ª e 2ª JCJs); 18 no interior do estado de São Paulo, nas cidades de Araçatuba, Avaré, Botucatu, Campinas (2ª JCJ), Catanduva, Guaratinguetá, Itu, Jaboticabal, Jacareí, Jaú, Jundiaí, Marília, Mogi-Mirim, Ourinhos, Presidente Prudente, São João da Boa Vista, São José do Rio Pardo e Votuporanga; e uma no Mato Grosso do Sul, na cidade de Campo Grande.

JUNTAS DE CONCILIAÇÃO E JULGAMENTO EXISTENTES DURANTE A PRESIDÊNCIA DE ROBERTO MÁRIO RODRIGUES MARTINS
JUNTA DE CONCILIAÇÃOCRIAÇÃOINSTALAÇÃOPRIMEIRO JUIZ-PRESIDENTE
1ª JCJ de São PauloDecreto 6.596/19401/5/1941Oscar de Oliveira Carvalho
2ª JCJ de São PauloDecreto 6.596/19401/5/1941Thelio da Costa Monteiro
3ª JCJ de São PauloDecreto 6.596/19401/5/1941José Veríssimo Filho
4ª JCJ de São PauloDecreto 6.596/19401/5/1941José Teixeira Penteado
5ª JCJ de São PauloDecreto 6.596/19401/5/1941Décio de Toledo Leite
6ª JCJ de São PauloDecreto 6.596/19401/5/1941Carlos de Figueiredo Sá
7ª JCJ de São PauloDecreto-lei 8.087/194516/3/1946João Rodrigues de Miranda Júnior
8ª JCJ de São PauloLei 2.279/1954 9/5/1955José Adolfo de Lima Avelino
9ª JCJ de São PauloLei 2.279/19549/5/1955Antônio Felipe Domingues Uchôa
10ª JCJ de São PauloLei 2.279/19549/5/1955Roberto Barreto Prado
11ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Rodolpho de Moraes Barros
12ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Enéas Chrispiniano Barreto
13ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Gabriel Moura Magalhães Gomes
14ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Paulo Marques Leite
15ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Nelson Ferreira de Souza
16ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Antonio Lamarca
17ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Raul Duarte de Azevedo
18ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Cid José Sitrangulo
19ª JCJ de São PauloLei 2.694/19552/1/1957Paulo Jorge de Lima
20ª JCJ de São PauloLei 3.873/196116/3/1964Mauro Quaresma de Moura
21ª JCJ de São PauloLei 3.873/19619/3/1964Rubens Ferrari
22ª JCJ de São PauloLei 3.873/19619/3/1964Clóvis de Castro e Campos 
23ª JCJ de São PauloLei 3.873/196116/3/1964Francisco Garcia Monreal Júnior
24ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/8/1974Oswaldo Sant’Anna
25ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/8/1974Antonio Carlos de Moraes Salles
26ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/8/1974Neusenice de Azevedo Barreto Küstner
27ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/8/1974Helder Almeida Carvalho
28ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/08/1974Walter de Moraes Fontes
29ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/08/1974Hildéa Reinert
30ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/8/1974Waldemar Thomazine
31ª JCJ de São PauloLei 5.643/197030/8/1974Ralph Cândia
32ª JCJ de São PauloLei 5643/197030/8/1974Carlos Eduardo Figueiredo
1ª JCJ de GuarulhosLei 3.873/196123/10/1962Marcondes Ancilon Aires de Alencar
1ª JCJ de MauáLei 5.892/197315/8/1974Júlia Romano Correa
1ª JCJ de Mogi das CruzesLei 3.873/196120/11/1962Aluysio Mendonça Sampaio
1ª JCJ de OsascoLei 5.643/197018/9/1971Rubens Ferrari
1ª JCJ de Santo AndréDecreto-lei 9.110/19461/5/1946Antônio Felipe Domingues Uchôa
2ª JCJ de Santo AndréLei 5.298/196712/11/1969Clóvis Canelas Salgado
1ª JCJ de SantosDecreto-lei 5.926/19434/4/1944José Ney Serrão
2ª JCJ de SantosLei 2.020/19531/4/1954Ildélio Martins
3ª JCJ de SantosLei 5.643/197015/9/1971Walter Cotrofe
1ª JCJ de São Bernardo do CampoLei 3.873/19617/9/1962José Amorim
1ª JCJ São Caetano do SulLei 2.763/195617/4/1957Bento Pupo Pesce
1ª JCJ de SuzanoLei 6.052/197423/8/1974Eldha Ebsan Menezes Duarte
1ª JCJ de AmericanaLei 3.873/196110/11/1962Wagner Drdla Giglio
1ª JCJ de AraraquaraLei 3.873/196105/11/1962José Victorio Fasanelli
1ª JCJ de BarretosLei 3.873/196111/1/1963Valentim Rosique Carrion
1ª JCJ de BauruLei 3.873/196120/10/1962Lázaro Bittencourt de Camargo
1ª JCJ de CampinasLei 5.926/19431/1/1944Abrãao Blay
1ª VT – FrancaLei 5.082/196617/2/1968Valentim Rosique Carrion
1ª JCJ de JundiaíLei 5.926/194330/3/1944Homero Diniz Gonçalves
1ª JCJ de LimeiraLei 4.088/19624/6/1969Pedro Vidal Neto
1ª JCJ de PiracicabaLei 3.873/196119/1/1963Carlos Eduardo de Figueiredo
1ª JCJ Ribeirão PretoLei 2.695/195519/3/1957Alfredo de Oliveira Coutinho
1ª JCJ de Rio ClaroLei 3.873/196124/11/1962Reynaldo Prestes Nogueira
1ª JCJ de São CarlosLei 3.873/196110/11/1962Francisco de Mattos Range
1ª JCJ de São José do Rio PretoLei 6.056/197427/09/1974Milton Rodrigues
1ª JCJ de São José dos CamposLei 3.873/196121/1/1963Neusenice de Azevedo Barreto Küstner
1ª JCJ de SorocabaLei 5.926/194331/8/1944Armando de Oliveira Netto
2ª JCJ SorocabaLei 5892/197315/8/1974Fernando Hernani Gentile
1ª JCJ de TaubatéLei 3.873/196121/11/1962Clovis Canellas Salgado
JCJ de CuiabáDecreto 6.596/1940 1/5/1941José Adolpho de Lima Avelino
JCJ de CorumbáLei 3.873/196104/12/1962Antônio de Souza Nogueira Filho 
1ª JCJ de CuritibaDecreto 6.596/194001/5/1941Jorge Ribeiro
2ª JCJ de CuritibaLei 3.873/196119/12/1961Júlio Assumpção Malhadas
3ª JCJ de CuritibaLei 5.643/197012/4/1972Hygidio Audi
4º JCJ de CuritibaLei 5.892/197329/10/1974Wantuil Abdala
1ª JCJ de Ponta GrossaLei 3.873/196125/10/1962Floriano Corrêa Vaz da Silva
1ª JCJ de ParanaguáLei 5.082/196619/7/1968Hildea Reinert
1ª JCJ de União de VitóriaLei 5.082/196617/11/1967Pedro Vidal Neto
1ª JCJ de LondrinaLei 3.873/196108/12/1962José André Berreta

Uma equipe afinada

Por mais que a situação na atividade-fim fosse alarmante, o que resultava em amplo tempo debruçado sobre essa temática, as questões envolvidas na gestão de Roberto Mário como presidente iam além. O objetivo do magistrado sempre foi conseguir melhorias para o órgão, em seus mais variados aspectos.  

“Ele foi o primeiro juiz concursado eleito presidente do Tribunal. Os demais que tinham estado como presidente não eram concursados; eram, sim, nomeados. Por conjunções políticas, aquilo tudo. Não por outra razão, a presidência dele, durante dois anos, foi de vento em popa. Trouxe ideias novas, sem estarem ligadas a conceitos políticos e de interesse, mas, sim, ligadas à Justiça, ao jurisdicionado. Para se fazer justiça da melhor maneira possível”, lembra o amigo Odonel.

O juiz Roberto Mário Rodrigues Martins em registro da década de 1970. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

E foi exatamente esse ar que Roberto Mário quis levar para sua gestão. Foi ele, por exemplo, o responsável por criar oficialmente, um Gabinete da Presidência. Formado por três salas (a do presidente, a do secretário-geral e a dos funcionários, onde eram despachados os processos), o gabinete contava com quatro pessoas. “Nesse gabinete, trabalhávamos: eu, como secretário-geral da Presidência; a Cristina, no despacho; no recurso de revista, uma outra pessoa; e um juiz convocado da primeira instância, Plinio Coelho Brandão”, conta Odonel Urbano Gonçales, o primeiro secretário-geral da Presidência do TRT-2.

A Cristina a que se refere Odonel é Cristina Maria de Paula Ferreira Martins, filha do ministro do TST, Ildélio Martins, primeiro juiz concursado do TRT-2 e da Justiça do Trabalho (e também o primeiro a pedir exoneração). A servidora atuou no TRT-2 de 1966 a 1992. Segundo Odonel, Cristina era muito próxima de Roberto Mário e “cuidava do gabinete com muito zelo e carinho”.

A preocupação em atuar da forma mais correta possível era tamanha que Roberto Mário chegou a teve uma indisposição com o padrasto, Alfredo Ellis, que sugeriu nomear determinada pessoa, com a qual o magistrado não concordava. O padrasto sugeria fazer política e Roberto Mário não aceitaria. Em sua gestão, valeria apenas o merecimento. E, por isso, “ficaram um bom tempo estremecidos“, lembra Silvia.

Roberto Mário Rodrigues Martins, presidentes do TRT-2
O juiz Roberto Mário Rodrigues Martins (1976-1978), na foto da galeria de presidentes do TRT-2. Fonte: acervo TRT-2.

Naquela época, o volume de trabalho já era muito grande. O secretário-geral era responsável por coordenar os despachos de recurso de revista, e outros processos que chegavam, além dos compromissos do presidente. “O tribunal, na época, já era o maior do país. Em relação a outros, era gigantesco. E não tínhamos a informática. Era tudo ou datilografado ou a mão. Então ele (o presidente Roberto Mário Rodrigues Martins) criou uma estrutura para dar conta desse trabalho”, lembra Odonel. 

Outra tarefa que demandava bastante tempo do presidente eram as correições. Até a década de 1980, o corregedor nato do tribunal era o presidente (ocasionalmente era possível a delegação do ato ao vice). Roberto Mário viajava com constância às unidades da Justiça do Trabalho da 2 Região, que, até o momento, estavam espalhadas pelos estados de São Paulo, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Durante muito tempo, teve como companheiro de viagem o secretário da Corregedoria, Antônio Roberto Andreazzi, que seria, anos mais tarde, também magistrado do Regional, tendo passado no mesmo concurso que Odonel Urbano Gonçales.

Se no âmbito judicial, a equipe de Roberto Mário era afinada, o mesmo poderia ser dito sobre o âmbito administrativo. O presidente tinha a seu lado, como diretora-geral da Administração, a servidora Maria Lavínia Torres Ribeiro. A admiração era tão grande que Maria Lavínia foi uma das poucas servidoras citadas pelo presidente no Relatório Anual de Atividades do Regional durante sua gestão.

“O crescimento natural da Justiça do Trabalho em São Paulo, a refletir-se através do aumento progressivo das atividades de seus diferentes órgãos; e a complexa e variada legislação, periodicamente vinda a lume, determinando, em consequência, inexoráveis alterações na estrutura orgânica e funcional da Administração, são fatores que, pela conexão e interdependência guardadas entre si, respondem, basilarmente, pelos intrincados problemas que convergem e buscam solução na Diretoria-Geral.

Todavia, não obstante as águas revoltas oferecessem dificuldades de navegação, a chegada ao porto foi tranquila e segura. Os trabalhos, conduzidos pela sra. Diretora-geral, da. Maria Lavínia Torres Ribeiro, tiveram execução plena e eficiente.”

Relatório Anual de Atividades do TRT-2 de 1977.

Conta Silvia, filha mais velha de Roberto Mário, que o pai e a diretora-geral do TRT-2 eram, de fato, bastante próximos. Silvia lembra que, quando Juarez, seu primeiro filho, nasceu (o primeiro neto de Roberto Mário), Lavínia deu um ursinho de pelúcia ao bebê, que foi guardado e depois passado ao bisneto de Roberto Mário. Maria Lavínia entrou no TRT-2 no cargo de escriturária, em 1948, e atuou durante 13 anos como diretora-geral do Regional, até sua aposentadoria, em dezembro de 1978.

Isabel de Castro Mello, TRT-2
A servidora Isabel de Castro Mello (à esquerda), seguida pelas também servidoras Maria Lavínia (centro) e Maria Julieta, irmã de Isabel (direita), todas falecidas. Fonte: fundo Isabel de Castro Mello / acervo TRT-2.

Foi Maria Lavínia que o apoiou em diversas ações realizadas durante os aos de 1976 e 1978, como a abertura, realização e homologação de concursos para servidores, a transformação do cargo de motorista em agente de segurança judiciária, ou mesmo nos estudos para implantação de um sistema de informática no Tribunal. As tratativas se intensificariam nos anos seguintes até o início da implantação do sistema, já na década de 1980 (mais sobre o assunto pode ser lido no texto Adeus, F-8: a desativação do SAP).

“No correr de 1977, Presidência teve ensejo de, por algumas vezes, afastar-se da Sede, girando as viagens empreendidas em torno de assuntos de exclusivo interesse deste Regional.

Assim sendo, esteve em renovadas ocasiões na cidade do Rio de Janeiro, participando de reuniões que contaram honrosamente com a presença de v. Exa., onde a questão primordialmente tratada dizia respeito à implantação, pela Dataprev, do sistema de processamento de dados, a fazer-se inicialmente nesta Região, como campo experimental.”

Relatório Anual de Atividades do TRT-2 de 1977.

Mas não seria só. Estudioso do direito, Roberto Mário foi quem pensou, pela primeira vez, na publicação de uma revista do TRT-2. A seu pedido, foi feito um primeiro contato, em 1977, com a Editora LTR. A primeira comissão da revista foi formada pelos juízes Antônio Lamarca (presidente), Bento Pupo Pesce e Aluysio Mendonça Sampaio. A publicação do primeiro volume aconteceria no mesmo ano de 1977. A edição trouxe não apenas artigos sobre o direito do trabalho, mas também o relatório de atividades do Regional e um compilado da jurisprudência (com acórdãos e ementário). Em 1978, haveria uma mudança na comissão, com a indicação de Roberto Barreto Prado, no lugar de Bento Pupo Pesce (que seria eleito vice-presidente do Regional), Antônio Lamarca e Aluysio Mendonça Sampaio. É possível acessar as primeiras edições da Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região no acervo da Biblioteca Nebrídio Negreiros.

Ainda em 1977, preocupado com o que poderia acontecer nas eleições que se aproximavam (e nas próximas também) propôs a alteração do regimento interno do tribunal (parágrafo primeiro do artigo nono), que permitia mandato de dois anos com possibilidade de suas reeleições para os cargos de presidente e vice. A proposta da Presidência era que presidente e vice pudessem ter apenas um mandato de dois anos. Mas não prosperou.

Também no mesmo ano, a pedido do corregedor-geral do TST, ministro Thélio da Costa Monteiro, determinou os estudos e a elaboração de um novo modelo de livro para registro de custas e emolumentos, “bem como a execução de serviços decorrentes da competência dada ao órgão para controlar as requisições de força policial, visando ao cumprimento de diligências” (Relatório Anual de Atividades de 1977). 

Nos corredores do Tribunal, tudo era muito tranquilo. Os servidores gostavam de Roberto Mário. “Foi um presidente amável, tratava todos funcionários com igualdade. Eu, pessoalmente, gostava muito dele”, conta Corina Maria Leite, servidora do TRT-2 entre 1973 e 1992.

Cora, como é conhecida, atuou na então Diretoria de Pessoal (atual Secretaria de Gestão de Pessoas) e, durante a presidência de Nelson Virgílio do Nascimento (1978-1980), assumiu a direção do então Setor Médico, onde ficou até se aposentar. Nos corredores do pequenino prédio da Rio Branco, servidores e magistrados encontravam-se com maior frequência, em especial para um cafezinho. Cora conta que Roberto Mário foi muitas vezes tomar café em sua sala, “comer biscoitinhos que uma colega fazia”, lembra.

Eram tempos de relações mais próximas, sem distâncias tão grandes entre as pessoas. Por isso mesmo, eram muito comuns confraternizações que reuniam servidores e magistrados. A quase totalidade delas tinha Cora (e sua querida amiga Clelia Checchia Carvalho Miranda, do então Setor de Concursos) à frente. É Cora também quem lembra que Roberto Mário ocasionalmente participava dos encontros, em especial em jantares organizados pelos juízes classistas.

Greves

“Era madrugada do dia 12 de maio, uma sexta-feira. Na fábrica da Scania em São Bernardo do Campo, na Seção de Ferramentaria, as máquinas se emudeceram. Pouco a pouco, o silêncio tomou o lugar do zunido dos tornos das outras seções. Martelos não ressoavam no metal, o maçarico não faiscava. O silêncio reinava absoluto na fábrica, sem o tilintar das chapas e barras de aço. Dez anos depois do levante de Contagem e Osasco, os metalúrgicos mais uma vez cruzariam os braços, desafiando os militares na primeira grande greve pós-AI-5”.

A luta sob o calor da forja, Centro de Memória do TRT-2

O ano de 1978 foi de extrema importância para a luta dos trabalhadores no Brasil. Pela primeira vez, desde a publicação do Ato Institucional 5 (AI-5) e depois de dez anos, os trabalhadores se mobilizavam.

A primeira grande greve, que mudaria os rumos do sindicalismo no país, começou no dia 12 de maio de 1978, quando, nas fábricas de caminhões da Saab-Scania, em São Bernardo do Campo, cerca de dois mil metalúrgicos cruzaram os braços, reivindicando aumento salarial e melhores condições de trabalho. O momento era de arrocho salarial e grande descontentamento.

Até o ano anterior, eram poucos os dissídios coletivos de greve que eram propostos no Tribunal, que, invariavelmente, declarava a ilegalidade das greves e aplicava o índice de reajuste determinado pelo governo.

A situação, porém, havia começado a mudar em 1977, quando um relatório do Banco Mundial revelou que os índices de inflação divulgados pelo governo estavam sendo maquiados. A reação viria dos trabalhadores.

Em 1978, para surpresa de empregadores e sindicato, operários da Scania, na região do ABC, cruzaram os braços, dentro da fábrica. A categoria pedia reajuste de 20%, superior ao índice oficial do governo, portanto, e melhores condições de trabalho.

Fábrica da Scania comunica a Delegacia Regional do Trabalho sobre o início das paralisações. Folha 3 do Dissídio Coletivo 99 de 1978.

Em São Paulo, o movimento era bastante forte. Enquanto os trabalhadores não aceitavam o a proposta de 6,5% de aumento pelo sindicato patronal, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) alegava que o movimento grevista havia sido organizado pelo sindicato (o que tornaria a greve ilegal e permita que os dirigentes sindicais fossem responsabilizados). No passar dos dias, o movimento se alastraria para outras empresas, como Ford, Mercedes-Benz e Volkswagen.

Diante do impasse durante as negociações na Delegacia Regional do Trabalho, a greve chegou ao TRT na noite do dia 16 de maio.

A greve ganhava força e parecia longe de um acordo. Governo solicita julgamento do TRT-2. “Jornal do Brasil”, 17 de maio de 1978. Fonte: Hemeroteca da Biblioteca Nacional.

Quem informou Roberto Mário sobre a paralisação foi o então secretário do tribunal, Domingos Manuel Escalera. O magistrado foi pego de surpresa. “Era um regime fechado naquela época, em 1978, nós não estávamos ainda em plena liberdade, em plena democracia, nós estávamos em um regime militar. E a greve era proibida. Aí eu falei: ‘Meu Deus do céu, quem são esses loucos que fizeram greve?’ “.

Enquanto as empresas negociavam com seus trabalhadores, os sindicatos tentavam chegar a um acordo no  TRT-2. A Ford era, naquele momento, a única empresa com trabalhadores paralisados.

A primeira audiência de conciliação foi realizada no dia 17 de maio. Segundo Roberto Mário, compareceram a Federação das Indústrias, representada por Eulálio Bueno de Vidigal Filho e, representando o sindicato dos trabalhadores, seu presidente, Luiz Inácio da Silva. Assim como o advogado da Federação dos Metalúrgicos, Almir Pazzianoto.

Em entrevista ao TRT-2, Roberto Mário lembrou que, naquela época, era inconcebível pensar que o sindicato poderia admitir que tinha organizado uma paralisação, pois haveria forte repressão. Por isso mesmo, quando questionado como o movimento tinha eclodido, a resposta foi simples: “Não, a greve estourou assim, espontaneamente”, afinal “que ninguém tinha coragem de dizer que o sindicato que havia orientado os trabalhadores”, como comentou Roberto Mário. O “Jornal do Brasil”, em sua edição do dia 18 de maio, conta que o advogado do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, Maurício Soares de Almeida, as paralisações haviam sido “espontâneas e resultantes da situação aflitiva” por que passavam os trabalhadores. E que o sindicato só havia assumido o comando das negociações “visando a compor os interesses, ao bem comum e aos interesses da pátria”.

Reportagem do jornal “Folha de S.Paulo”, mostra o juiz Roberto Mário Rodrigues Martins (centro) presidindo a audiência de conciliação entre o Sindicato dos Metalúrgicos (com Lula, à direita) e o sindicato patronal. Fonte: acervo Folha.

Apesar de Roberto Mário ter apresentado uma proposta de conciliação, não houve acordo, o que levou ao julgamento da greve, na noite do mesmo dia. Ao final, por 15 votos a 1 (o do juiz classista Marcelino Marques), o TRT-2 declarou a ilegalidade do movimento paredista e determinou o imediato retorno dos trabalhadores às suas atividades. A decisão, no entanto, não afetava as demais empresas paralisadas, que deveriam instaurar dissídios próprios.

Jornal divulga decisão do TRT-2. Jornal do Brasil, 19 de maio de 1978. Fonte: Hemeroteca da Biblioteca Nacional.

Apesar do resultado, Luiz Inácio da Silva, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, informou que a entidade não solicitaria o retorno dos trabalhadores.

Após 10 anos dos movimentos de 1968 os trabalhadores voltariam a se reorganizar. Jornal Movimento, 22 de maio de 1978. Fonte: Hemeroteca da Biblioteca Nacional.

No dia seguinte, mais empresas entravam em greve. O movimento ainda se estenderia para outros estados e mais categorias. Duraria até 29 de maio, após dias de negociações. Na mesma data, os jornais anunciavam o envio ao Congresso Nacional do projeto da Lei Orgânica da Magistratura, pelo presidente Ernesto Geisel,  e a despedida do general João Baptista Figueiredo do Serviço Nacional de Informações. Figueiredo viria a ser o presidente do Brasil a partir de 1979.

Considerada “mais um indício dos tempos”, pelo porta-voz oficial do governo, o coronel Rubem Ludwig, que ainda respondeu à pergunta se estaria associando a existência de greve a um clima de abertura política com um mero: “O que é que vocês acham?”, a greve dos metalúrgicos do ABC foi a primeira de uma série de movimentos paredistas, que se estenderiam até 1980 e daria início a um novo sindicalismo. A abertura do país a que quase fez referência o coronel Ludwig ainda era relativa. Alguns jornais da época foram proibidos de mencionar a paralisação que ocorria pelo país.  

“Tribuna Metalúrgica”, em edição de junho de 1978, retrata como positiva a experiência da greve. Fonte: acervo TRT-2.

Os relatos dessa importante greve podem ser vistos no Dissídio Coletivo nº 99 de 1978, pertencente ao acervo histórico do TRT-2.

A saída da Presidência e a aposentadoria

No dia 12 de setembro de 1978, a segunda instância do TRT-2 reuniu-se para a realização de uma nova eleição, para a gestão 1978-1980. Para o cargo de presidente, foi escolhido o juiz Nelson Virgílio do Nascimento (originário do Ministério Público da União, nomeado pelo Quinto Constitucional, em 1968). Para vice, Bento Pupo Pesce (também nomeado no II Concurso da Magistratura do TRT-2 e juiz de tribunal desde 1977).

Apesar de não ter conseguido alterar o regimento interno do Regional durante sua gestão, não haveria mais, até a história recente, um presidente que ficasse por mais de um mandato à frente do TRT-2. De certa forma, uma vitória de Roberto Mário.

O magistrado deixava seu cargo à frente do Regional com uma primeira instância formado por 63 juntas de conciliação e julgamento (sendo 32 em São Paulo e 29 distribuídas no interior do estado de São Paulo, uma no Mato Grosso e uma no Mato Grosso do Sul. E outras 41 ainda por vir. Sabia que o novo mandatário teria uma árdua missão: “lograr a necessária estrutura: juízes, funcionários, verbas, prédios etc., para sua instalação e funcionamento” (Relatório Anual de Atividades de 1978).   

Após deixar a Presidência do TRT-2, em 15 de setembro de 1978, Roberto Mário Rodrigues Martins foi designado para a 2ª Turma do Regional. Teve a seu lado, novamente, Odonel Urbano Gonçales, que o “abandonaria” apenas em 1980, quando foi nomeado juiz substituto no TRT-2.

Carteira funcional do juiz Roberto Mário Rodrigues Martins. Fonte: acervo TRT-2.

“Eu acompanhei o Roberto Mário na Turma, como assessor dele; na Vice-Presidência, como assessor; na Presidência, como chefe do gabinete dele; e quando ele foi para o TST, como assessor dele lá”, conta Odonel. Roberto Mário foi convocado algumas vezes para substituir no Tribunal Superior do Trabalho. O magistrado tinha a esperança de ser promovido a ministro, mas não aconteceu. E talvez isso, na visão de Odonel, tenha apressado sua aposentadoria. De qualquer forma, Roberto Mário tinha verdadeiro orgulho de sua trajetória.

Em 1º de junho de 1982, Roberto Mário Rodrigues Martins aposentou-se do TRT-2, passando a advogar perante o TRT-15. Anos depois, quando Odonel aposentou-se, foram advogar juntos. E nunca tiveram uma briga, como conta o amigo e sócio, sem esconder o orgulho. 

Quem se lembra dessa época é a desembargadora aposentada do TRT-15, Eliana Felippe Toledo. Segundo ela, Roberto Mário era um excelente advogado.

A desembargadora cita, ainda, dois aspectos importantes dessa fase da carreira do magistrado: a qualidade da sustenção oral (uma das partes favoritas de Roberto Mário no exercício da advocacia) e a ética: “Ele sabia onde ficar sempre”, comenta Eliana. Roberto Mário tinha plena consciência do papel que exercia naquele momento de sua carreira e não usava de sua posição de juiz de tribunal aposentado e ex-presidente do TRT-2 para obter qualquer tipo de vantagem.

O juiz Roberto Mário Rodrigues Martins (de camisa azul) com o amigo Odonel Urbano Gonçales (camisa polo vermelha). Na foto também, a filha e o genro de Odonel: Rosana e Marco. Fonte: fundo Odonel Urbano Gonçales / acervo TRT-2.

Roberto Mário advogou durante muitos anos. Afinal, tinha apenas 56 anos quando deixou o TRT-2. Manteve-se profissionalmente ativo até pouco depois dos 80. Quando resolveu se aposentar de vez. Aproveitou muito o tempo disponível, em especial com sua esposa, as filhas, os netos e bisnetos.

#PRESIDENTES DO TRT-2 NOS ANOS DE ATUAÇÃO DE ROBERTO MÁRIO RODRIGUES MARTINSMANDATO
2Oscar de Oliveira Mendonça1942-1944
3Nebrídio Negreiros1944-1946
4Ernesto Mendonça de Carvalho Borges1946-1948
5José Teixeira Penteado1948-1953
6Thélio da Costa Monteiro1953-1954
7Hélio Tupinambá Fonseca1954-1959
8Décio de Toledo Leite1959-1963
9Hélio de Miranda Guimarães1963-1967
10Homero Diniz Gonçalves1967-1976
11Roberto Mário Rodrigues Martins1976-1978
12Nelson Virgílio do Nascimento1978-1980
13Nelson Ferreira de Souza1980-1981
14Antônio Lamarca1981-1982

A vida em Campinas

Apesar de ter nascido em Santos e passado toda a sua juventude em São Paulo, quando decidiu se mudar para Campinas, Roberto Mário Martins Rodrigues transformou a nova cidade em seu lar. Silvia, a filha mais velha, conta que o pai falava que era campineiro de coração.

Acabou, inclusive, por adotar não apenas um, mas dois outros times de futebol: o Guarani e a Ponte Preta, influência dos genros (cada um torcedor de um time da cidade de Campinas) e de alguns amigos, como o advogado Álvaro Cury. “Mas no fundinho, no fundinho, eu acho que ele era mesmo bugrino, torcedor do Guarani”, comenta Silvia, entre risos.

Roberto Mário Rodrigues Martins com o amigo Álvaro Cury. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Roberto Mário gostava de aproveitar o que a cidade tinha a lhe oferecer. Era sócio da Hípica da região, onde eram frequentes as partidas de tênis (um de seus hobbies preferidos, compartilhado pela esposa, Elisa). Era visto com recorrência nos ambientes do clube nos fins de semana, sempre em animadas conversas, regadas a uma cervejinha, vez ou outra. Foi assim a vida toda.

Roberto Mário Rodrigues Martins (em destaque) e a esposa, Elisa, com amigos na Hípica de Campinas, em registro da década de 1960. Fonte: Centro de Memória Hípica.

Roberto Mário foi ainda professor titular de direito do trabalho e direito processual do trabalho da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Campinas. Silvia, a filha mais velha, foi, inclusive, sua aluna. Conta que o pai era bastante minucioso e extremamente exigente. Não admitia barulhos e conversas paralelas na sala de aula. “Em dia de prova, ele passava, olhava a CLT, achou cola em várias”. E corrigia cada prova com extremo cuidado.

Sua fama de exigente era tão grande que, certa vez, chegou na sala e havia uma fera desenhada na porta, na hora de sua entrada. “Era constrangedor pra mim, como filha”. Mas, aos poucos, as coisas foram mudando. “O pessoal foi amadurecendo, foi chegando o quarto ano, e vendo realmente que a matéria que eles sabiam mais era direito do trabalho. Porque ele exigia, ele cobrava, ele dava aula, ele preparava, então a coisa começou a mudar. Começaram a procurar muito, pedir explicações”. No fim, Roberto Mário foi convidado para ser o paraninfo da turma de sua filha. Daquela sala, cerca de 80% optou por Direito do Trabalho. E ainda pôde contar com o apoio do magistrado, que se colocou à disposição para ajudar seus alunos na hora de prestar o exame da Ordem. A “turma do primário” (como brinca Silvia, ela mesmo dez anos mais velha que seus colegas de sala) cresceu, aprendeu e entendeu o motivo da atitude do tão exigente professor Roberto Mário.

Roberto Mário Rodrigues Martins durante a formatura da filha mais velha, Silvia. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Roberto Mário Rodrigues Martins não exigia, porém, apenas de seus alunos (ou de suas filhas). Silvia conta que o pai era exigente consigo mesmo e ficava bastante irritado quando algo não acontecia de acordo com o esperado (o extremo oposto de Elisa, a esposa, uma pessoa “extremamente tranquila”). Quando trabalhava em casa, fechava-se no escritório. As filhas já sabiam que não era momento de incomodar o pai: estava debruçado em seus processos. E havia pilhas deles.

Com o passar dos anos, no entanto, “melhorou muito”. Os netos talvez tenham tido grande influência. O primeiro deles, Juarez, o filho mais velho de Silvia, foi também o primeiro menino da família. Uma grande alegria para Roberto Mário, que, na falta de meninos, já tinha “adotado” seus genros.

Em seu discurso de posse como presidente do TRT-2, em 1976, algo já demonstrava a mudança que estava por vir. “Ele disse: ‘E vem vindo aí uma das maiores alegrias da minha vida: um molecão ou a fofinha’. Nós não sabíamos ainda se era menino ou menina. E veio um menino. Nossa senhora! Ele ficou enlouquecido”, lembra Silvia. Brincalhão, o magistrado gostava de contar que o neto era o que ele mais gostava – “por antiguidade”.

Em paralelo a essa personalidade forte, existia ainda um marido e um pai muito amoroso. E um divertido amigo.

Ele gostava muito de conversar, de contar histórias. “Apesar de ter falecido com 95 anos e meio, ele manteve uma lucidez muito grande, muito forte”, como lembra o amigo, Odonel. Era sempre o foco da conversa, não importa onde estivesse. Simpático, conversava sobre qualquer assunto (e com qualquer um). Gostava sempre de estar ao redor de pessoas.

Em 2016, para comemorar seus 90 anos, a família organizou uma festa surpresa. Reuniu diversos parentes e amigos. O sobrinho Eduardo Guimarães (filho de Gilda, uma das irmãs de Roberto Mário), que por muitos anos atuou no TRT-2, também esteve presente. Faleceria alguns anos depois, em decorrência de um agressivo câncer.

Vida em família

Sua relação com a esposa, Elisa, foi de extremo amor. Nunca acreditou que ela pudesse partir antes dele próprio (algo que ocorreu em 2017, em consequência de um repentino infarto). Tanto que, na época em que enfrentou uma grave doença, já estava deixando tudo preparado para que ela não enfrentasse qualquer dificuldade, para que estivesse amparada. Foi uma grande surpresa. Estavam casados há 64 anos. E o magistrado sentiu bastante o cruel golpe.

Segundo Silvia, Roberto Mário era responsável por toda a parte financeira da casa, incluindo banco e pagamentos. Já a parte de administração da residência, era com Elisa. “Meu pai não sabia nada, não sabia onde ficava o prato guardado”. Roberto Mário estava com 91 anos.

O juiz Roberto Mário Rodrigues Martins, ao lado da esposa, Elisa. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Diante da situação, a família sugeriu que ele fosse morar com a filha mais velha. O magistrado não permitiu sequer a finalização da frase. Iria ficar em sua casa. E tudo foi organizado para que ele pudesse viver confortavelmente em sua própria casa, ainda que houvesse uma companhia.

Seu grande apoio foram as filhas, Silvia e Flavia. Roberto Mário tinha uma relação muito próxima com suas meninas. E ainda mais com netos e bisnetos. Uma de suas bisnetas, por sinal, chama-se Elisa, mesmo nome de sua falecida esposa. Quando soube, foi uma grande emoção.

Roberto Mário Rodrigues Martins
O juiz Roberto Mário Rodrigues Martins, em um de seus últimos registros fotográficos. Fonte: fundo Odonel Urbano Gonçales / acervo TRT-2.

Roberto Mário adorava crianças. Mesmo antes de ter seus netos, já se preparava para a nova fase de avô. Dalmo Dalbem Câmara, filho de Maria José Dalbem Câmara (servidora entre 1981 e 2006) e Antônio Meirelles Câmara (servidor do TRT-2 entre 1971 e 1994; e zelador do prédio da av. Rio Branco) é prova disso. Quando criança, morava com seus pais no prédio do TRT-2 na avenida Rio Branco. Seu companheiro ocasional de diversão era o juiz Roberto Mário Rodrigues Martins, que costumava brincar de faroeste com o garoto (e com direito a efeitos sonoros e tudo). “Ele era assim mesmo”, relembra Odonel, fazendo questão de mencionar que havia momentos para brincadeiras. Mas também para ser sério.

De fato, uma grande alegria de sua vida era a família. Filhas e netos, mesmo após casados, continuaram a viver em Campinas (com exceção de Roberta, filha de Silvia, que mora na cidade de São Paulo, mas que visita com frequência os pais), o que permitia constantes reuniões familiares, que aconteciam sempre aos sábados. “Foi assim até o final”, como lembra Silvia.

Ele gostava de onde vivia. E era feliz por poder estar ao lado de sua família, ali em Campinas. Silvia conta que mesmo quando o pai se tornou juiz do tribunal (o atual cargo de desembargador), Roberto Mário não cogitou retornar para São Paulo. Ele ia e voltava todos os dias. Em determinado momento, devido ao volume de trabalho, alugou um pequeno apartamento próximo ao Tribunal, assim não precisava retornar tarde da noite para Campinas.

Quando saiu da Presidência do TRT-2 e passou a ser convocado para o Tribunal Superior do Trabalho começou a ficar preocupado. Ficava muito tempo distante e tinha receio de que Roberta (sua recém-nascida neta, a única menina entre os netos, e com nome em homenagem ao avô) não conseguisse reconhecê-lo. Mas seu dever o chamava.

Outra alegria foi a opção profissional de um de seus netos, Caio Rodrigues Martins Passos (filho de sua caçula, Flavia). Contava com muito orgulho de seu neto juiz do Trabalho em Campinas, a cidade que ele tanto amava.

Roberto Mário Rodrigues Martins era um apaixonado pelo direito (ocupou, inclusive, a cadeira de número 51 da Academia Brasileira de Direito do Trabalho) e pela magistratura trabalhista. Falava em casa sobre a responsabilidade que tinha e as preocupações que carregava no exercício de sua função judicante. Amava o que fazia. Mas conseguia dividir todo seu afeto com a família e com os amigos.

O juiz Odonel Urbano Gonçales (esquerda) com a filha, Regina Rodrigues Urbano, e o juiz Roberto Mário Rodrigues Martins (no centro, de branco), no último registro juntos. Fonte: fundo Odonel Urbano Gonçales / acervo TRT-2.

Era também um grande contador de histórias. Falava por mais de uma hora ao telefone com a equipe do Centro de Memória sem se cansar, apesar de seus mais de 90 anos. Vez ou outra esquecia uma data ou um nome, mas tinha uma memória incrível. E uma educação admirável.

Tentamos entrevistá-lo algumas vezes, mas, infelizmente, a saúde e depois a pandemia não permitiram. Conversamos por telefone, no entanto. E, a cada conversa, foi possível conhecer um pouco mais sobre a história e sobre o caráter de nosso biografado.

A pandemia trouxe outras consequências em sua vida. Em 2021, Roberto Mário sofreu uma queda em casa e machucou bastante a mão. Teve que ir ao pronto-socorro para fazer curativos – e retornou algumas vezes. Dias depois de uma das visitas ao hospital, sentiu-se mal. Tinha sido acometido pelo vírus da Covid-19. Teve seus pulmões tomados em pouco tempo e faleceu alguns dias depois, em 26 de junho. Não esteve sozinho, porém. A família ficou com ele o tempo todo, mesmo durante a internação no hospital.

Roberto Mário Rodrigues Martins (de azul), na comemoração de seus 95 anos. Fonte: fundo Roberto Mário Rodrigues Martins / acervo TRT-2.

Roberto Mário Rodrigues Martins faleceu aos 95 anos de idade. Apesar das pequenas limitações que a idade impõe ao corpo, a cabeça permaneceu muito boa. Lia, assistia à televisão (em especial campeonatos de tênis, como Roland Garros): “Junto com a família o tempo inteiro, muito ligado com a família”, conta Silvia.

Dizia-se um afortunado. Realizado na vida profissional e na vida pessoal. “Não posso querer nada da vida. Trabalhei com o que eu quis, fui casado com a mulher mais incrível, tive filhas, genros, netos, oito bisnetos. Isso é uma bênção”, lembra Silvia das palavras de seu pai.

“Ele era um homem sério, um homem dedicado a sua família, um homem honesto, um homem vocacionado para a magistratura e um grande amigo, que, durante 52 anos, tive o privilégio de ter”, lembra o juiz Odonel Urbano Gonçales. “Uma pessoa maravilhosa na vida de muita gente; um amigo que todo mundo sonha ter”, menciona, com carinho, a desembargadora Eliana Felippe Toledo. E mais uma daqueles importantes personagens, que ajudaram a construir o TRT-2 e, com seu trabalho e dedicação, deixaram sua marca em nossa história.

Memórias Trabalhistas é uma página criada pelo Centro de Memória do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, setor responsável pela pesquisa e divulgação da história do TRT-2. Neste espaço, é possível encontrar artigos, histórias e curiosidades sobre o TRT-2, maior tribunal trabalhista do país.

Acesse também o Centro de Memória Virtual e conheça nosso acervo histórico, disponível para consulta e pesquisa.


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Publicado por Christiane Teixeira Zboril

Radialista, jornalista e historiadora, é especialista em Comunicação Pública. Possui experiência com produção de rádio e TV, assessoria de imprensa, eventos e gestão de mídias sociais. Adora fazer planos, conhecer novos lugares e pessoas, além de ouvir uma boa história. Desde 2012, é servidora do TRT-2.

7 comentários em “PRESIDENTES DO TRT-2: ROBERTO MÁRIO RODRIGUES MARTINS

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